Publicado em 26 de maio de 2023 às 14:19
O governo federal anunciou nesta quinta-feira (25/5) que adotará medidas para baixar o preço de automóveis no país.>
Geraldo Alckmin (PSB), vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, afirmou que para isso haverá uma redução de impostos federais para carros de até R$ 120 mil.>
A decisão foi comunicada após uma reunião no Palácio do Planalto entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e representantes da indústria automobilística.>
Na mesma ocasião, Alckmin também anunciou que o governo disponibilizará uma linha de crédito de R$ 4 bilhões em dólares para financiamento de exportações, por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). >
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A medida, segundo ele, serve como uma proteção cambial e abrangerá não apenas o setor automotivo, mas a indústria como um todo.>
Lula já havia reclamado publicamente sobre os preços de veículos no país.>
"A fábrica de automóveis não está vendendo bem, mas qual pobre pode comprar um carro popular de R$ 90 mil?", questionou Lula da Silva durante sessão inaugural do Conselho de Desenvolvimento, Econômico e Social, no início de maio.>
No entanto, detalhes de como será o programa de fato ainda serão anunciados nos próximos 15 dias, após uma análise da Fazenda sobre o programa.>
A BBC News Brasil conversou com analistas sobre o que foi divulgado até agora e os possíveis impactos destas medidas. Entenda a seguir.>
O governo anunciou que fará uma redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), aplicado sobre a fabricação, importação e venda destas mercadorias, inclusive automóveis, e do tributos do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins), que incidem sobre o faturamento das empresas e usados para financiar a saúde pública e Previdência Social.>
O índice de redução ainda não divulgado pelo governo, mas o governo afirmou que a porcentagem do desconto será baseada em três critérios: social, eficiência energética e densidade industrial. >
Isso significa que, na prática, automóveis mais baratos, menos poluentes e mais econômicos em gasto combustível, assim como os que possuem mais peças nacionais em sua composição, terão mais desconto. >
De acordo com Alckmin, quanto mais critérios forem atendidos, maior será a redução no preço. Ele também sinalizou com a possibilidade de desconto maior por venda direta da indústria.>
"Isso acontecerá para aqueles que têm um CNPJ de empresa e decidirem usar na hora de comprar o carro. A legislação brasileira permite que a montadora tenha uma taxa menor de impostos vendendo para empresas", explica Paulo Cardamone, presidente da Bright Consulting, especializada no mercado automobilístico.>
Algumas duvidas continuam em aberto como por exemplo se a indústria será obrigada a repassar as reduções nos impostos para o consumidor final.>
Ou, por exemplo, por quanto tempo essas medidas vão valer, já que o governo afirmou que se trata de um programa transitório que visa reduzir a ociosidade da indústria automobilística brasileira.>
A expectativa do governo é que a redução de impostos faça o preço dos automóveis cair entre 1,5% a 10,79%.>
Cardamone avalia que a redução de impostos tem o potencial de baratear mais de um quarto dos modelos à venda atualmente.>
"Para se ter uma ideia do tamanho da mudança, hoje nós temos aproximadamente 600 modelos de veículos sendo vendidos e cerca de 160 deles, 25%, estão dentro dessa faixa de preço passível de desconto, e representam 47% do volume de carros no mercado", diz o analista.>
Cardamone afirma que, considerando o objetivo de tornar os veículos mais acessíveis para quem tem menor renda, o limite de R$ 120 mil é razoável. >
"A redução para faixa de preço mais altas privilegiaria apenas quem tem renda muito alta." >
No entanto, detalhes da fórmula que será aplicada ainda não são conhecidos para se poder precisar quanto o preço de cada modelo poderá cair.>
Após o anúncio, o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Márcio Lima Leite, pode levar o preço dos modelos mais em conta ficar abaixo de R$ 60 mil.>
No entanto, os carros mais baratos hoje no Brasil, Renault Kwid e Fiat Mobi, ficariam acima disso com os índices anunciados pelo governo.>
Se eles recebessem a redução máxima prevista, de 10,79%, por exemplo, passariam dos R$ 68.990 atuais para R$ 61.545.>
Analistas apontam que uma redução de impostos que barateie os carros tem o potencial de aumentar as vendas e, portanto, reaquecer a produção indústrial.>
Isso, por sua vez, aumentaria a oferta de empregos e a renda de parte da população, estimulando o consumo e aumentando a arrecadação do governo, beneficiando a economia de forma geral. >
“Se bem desenhado, o programa do veículo acessível poderia trazer, inclusive, um equilíbrio na arrecadação, porque estaria substituindo veículos usados que geram imposto menor, com marginal impacto positivo nos empregos, agradando o governo em termos políticos", avalia Cardamone.>
O faturamento do setor, que caiu 43% em dez anos, também é um fator importante por trás da medida.>
"O Brasil já produziu cerca de 3,8 milhões de veículos em um ano, e hoje esse número está estagnado em um patamar de 2 milhões de veículos. É uma ociosidade de quase 50% da produção, o que não é normal no setor automotivo, que precisa ocupar ao menos 70% de sua capacidade produtiva", afirma Cardamone. >
"O governo olha esse setor, que já teve grande contribuição tributária, e procura uma forma de tentar recuperar isso." >
Cardamone aponta que um ponto importante a ser considerado é a duração do benefício. >
"A medida não pode ser eterna porque é uma renúncia fiscal importante. Não se sabe se vai durar seis meses, um ano… Particularmente, eu acho que em um intervalo entre julho a dezembro, por exemplo, funciona." >
O analista calcula que o programa teria o potencial de aumentar as vendas em aproximadamente 120 a 130 mil automóveis em seis meses — um crescimento 6% acima do previsto atualmente para o setor. >
Por outro lado, aponta o analista, a renúncia fiscal neste mesmo período deve girar em torno de R$ 4 bilhões.>
"Se a medida durar um ano, já são R$ 8 bilhões a menos para um governo que não passa por um momento econômico fácil.">
Antonio Jorge Martins, coordenador acadêmico dos cursos da área automotiva na Fundação Getúlio Vargas (FGV), aponta que não vê estes impactos acontecendo "da noite para o dia" e acrescenta que pode ser necessário ir além do corte de impostos.>
"Talvez não somente a redução dos preços, mas também as melhores condições de obtenção de financiamento, resultem em um cenário melhor para aumentar a produção do setor.">
Lula tocou neste ponto horas depois do anúncio, em evento na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), quando voltou a criticar o preço atual dos carros e os altos juros que impedem o consumidor de buscar crédito.>
O presidente afirmou que a maioria dos carros vendidos no ano passado foram vendidos à vista, segundo ele, "porque não tem política de crédito para financiar. E a classe média baixa não está comprando mais carro, porque um carro popular de R$ 90 mil não é mais popular".>
Martins ressalta ainda que o imposto que mais impacta o preço de veículos atualmente é o ICMS, cobrado pelos Estados.>
"Eu não sei exatamente do entendimento do governo federal com os Estados no sentido de propiciar também a redução do ICMS, mas acredito, inclusive, que a redução desse imposto seria mais relevante do que os impostos federais.">
Embora haja uma expectativa de redução nos preços, a volta dos carros populares como os brasileiros já conheceram não deve acontecer, segundo os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil.>
Isso porque os veículos vendidos com este mote em épocas passadas, quando a indústria tinha números de produção e venda bem superiores aos atuais, se tornaram ultrapassados e não têm mais lugar no mercado hoje.>
"O carro popular antes se caracterizava por um baixo nível de segurança e opções bastantes reduzidas de conforto e tecnologia. Não é mais possível usar esse termo - o que teremos daqui para frente são 'carros de entrada'", afirma Martins. >
Cardamone explica que o aumento dos preços nos últimos anos se deveu a um processo de modernização dos modelos.>
"É importante para o Brasil ter segurança em termos de menos acidentes e ser responsável com o meio ambiente. Ou seja, se juntar a regulação ideal com esse consumidor de maior poder aquisitivo, que quer tudo no carro, conectividade, infoentretenimento, ter o 'iPhone' dos carros, não tem o que fazer — o preço sobe.">
Há também outros motivos, mais abrangentes, que afetaram os preços e a capacidade de compra da população.>
Custos gerais de logística, frete e acesso à elementos de tecnologia encareceram no Brasil e no mundo afetados pela pandemia da covid-19, conforme apontado em uma reportagem da BBC News Brasil.>
"Paralelamente, aqui no Brasil, nós tivemos uma desvalorização cambial e também tivemos a inflação. Isso tudo fez com que as empresas passassem a repassar esses custos aos seus consumidores finais", complementa Martins.>
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