Publicado em 4 de julho de 2018 às 00:46
Ele é pequeno, tem 18,3 mil habitantes e fica no Sul capixaba. Ela já é quase sete vezes maior, abriga 124,5 mil moradores em seu território e está localizada no Noroeste. Quem conhece as cidades de Muniz Freire e Colatina, que ficam 205 quilômetros distantes uma da outra, pode pensar que a única semelhança entre elas é mesmo o café, principal atividade econômica de ambas.>
Poucos sabem, no entanto, que as duas figuras homenageadas no nome dos municípios formavam um casal importante no Espírito Santo no fim dos anos 1880 e início do século 20.>
Ele, José de Melo Carvalho Muniz Freire, nascido em Vitória em 1861, foi vereador da Capital, deputado estadual e federal, senador por dois mandatos e governador do Estado (na época o título era de presidente da província), entre 1892 e 1896 e depois de 1900 a 1904.>
Ela, Colatina Soares de Azevedo, nasceu três anos depois, em 1864, em São Paulo, neta do barão de Paranapanema, pertencente portanto a uma família influente naquela província. A jovem bela e católica tradicional tinha boa formação educacional.>
>
Muniz Freire e Colatina se casaram em 28 de janeiro de 1882 e tiveram 10 filhos: Izilda, José de Mello Carvalho Muniz Freire Filho, Alarico, Átila, Genserico, Olga, Dora, Ragadázio, Manoel e Ilma, segundo informa o site da Prefeitura de Colatina.>
Nos acervos históricos do governo capixaba, não há documentos ou registros que contam como o casal se conheceu ou que informam detalhes do relacionamento; tampouco há fotos de marido e mulher juntos.>
Uma das poucas intimidades do casal é contada pela revista do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo (IHGES), que em 1961 publicou uma edição em homenagem ao centenário de Muniz Freire, com um discurso de José Paulino Alves.>
Dona Colatina tinha uma medalhinha da Virgem, medalhinha toda de ouro maciço, presente da avozinha dela. Quando o doutor Muniz Freire viajava, fazia questão que levasse consigo essa peça de metal, intrínseca e extrinsecamente preciosa, para o proteger, diz o registro do IHGES.>
Diante da fé e do cuidado da esposa, o político nunca hesitou em levar o amuleto e, quando voltava das viagens, que segundo a publicação eram quase sempre de curta duração, sempre devolvia a peça grato e sorridente.>
A revista, à época, lembrou uma das poucas vezes que o ex-governador partiu para uma viagem e esqueceu-se da medalhinha. Sem citar o ano, José Paulino Alves contou que durante inspeção às obras da Estrada de Ferro Sul do Espírito Santo, uma das iniciativas do seu governo, Muniz Freire não se lembrou de pedir o objeto.>
Esquecera-se de pedir a medalhinha... já quando se encontrava no Cais do Imperador, para tomar o barco que o devia transportar ao continente, eis que lhe vem à lembrança: E a medalhinha?. Mas Dona Colatina não houvera esquecido: trazia-a consigo. Entregou-lhe. E, beijando-a com enternecido afeto, o Dr. Muniz Freire modalizou a voz na inflexão necessária à ênfase do que dizia: És santa, Colatina! Santa Colatina, sem dúvida!, diz o texto.>
Revista do IHGES
FORMAÇÃO>
Muniz Freire era interessado pelo jornalismo, mas se formou pela Faculdade de Direito de São Paulo em 1881, onde, ao que tudo indica, conheceu Colatina e com ela se casou, em 1882. Ele vinha de uma família de políticos e era filiado ao Partido Liberal, assim como seu pai, avô materno e primo.>
Em um resgate a memória da topônima, a Prefeitura de Colatina conta em seu portal que a jovem, ainda solteira, já dominava os idiomas alemão, francês e italiano, além de possuir talento e voz singular no canto.>
Também aprendeu música com um dos maestros mais famosos da época, Girondon, e participou cantando de muitos saraus nos palácios em São Paulo, na administração do então governador (presidente do Estado) Florêncio de Abreu, diz o texto.>
Já casado, ele ocupou seu primeiro cargo público em 1882, quando foi eleito vereador de Vitória e, posteriormente, deputado provincial (estadual), cargo que ocupou até 1889, quando conquistou o posto de deputado federal.>
Exatos 10 anos após iniciar sua trajetória política, Muniz Freire tomou posse como presidente do Estado em 3 de maio de 1892, após ser eleito pela Assembleia Legislativa do Espírito Santo. As principais obras de seu governo, segundo teses de mestrado e doutorado de historiadores capixabas, foram melhorias urbanas na Capital e a Estrada de Ferro Sul.>
A historiadora Maria da Penha Smarzaro Siqueira, ao contar o desenvolvimento do Porto de Vitória em livro, ressaltou que o governo Muniz Freire foi responsável por endividar o Estado, apesar de coincidir sua gestão com um período de euforia econômica capixaba devido ao aumento das exportações cafeeiras e à alta da receita por causa do imposto de exportação.>
Já o historiador Leandro do Carmo Quintão, em sua tese Oligarquia e Elites Políticas no Espírito Santo: a configuração da liderança de Moniz Freire, lembra que, apesar do fato, o personagem-título teve alta popularidade, tendo quase conseguido, com a ajuda dos deputados estaduais, a aprovação de uma emenda constitucional que garantiria sua reeleição. Apesar do fracasso, saiu do primeiro mandato com extrema popularidade e, como principal oligarca do Estado, à frente do Partido Republicano Construtor, narra.>
Ele retornou ao governo do Estado em 1900, quatro anos depois de deixá-lo, ocupando o posto de presidente até 1904. Após o novo mandato, ainda foi senador pelo Espírito Santo por duas legislaturas, entre 1905 e 1914, quando faleceu no Rio de Janeiro.>
HOMENAGENS>
O ex-governador foi homenageado em 1986, quando o povoado de Vila do Espírito Santo do Rio Pardo foi elevado a município e passou a se chamar Muniz Freire.>
Nos registros antigos, o político era chamado ora de Muniz, ora de Moniz Freire. No entanto, na época de criação do município do Sul, predominou nos acervos a primeira versão, fazendo com que esta seja a mais usada ainda hoje para se referir a esse importante personagem da história capixaba.>
Apesar de a data de falecimento de Colatina não ser revelada pelos documentos históricos, em 1899 ela foi homenageada com o nome à Vila de Colatina, decisão do então desembargador Afonso Cláudio. Em discurso, à época, ele disse: Esta homenagem à paulista, certamente, tornará próspera a futura cidade.>
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta