Autor(a) Convidado(a)
É escritor, curador cultural e diretor no IHGES

Rendeiras de bilro, patrimônio cultural quase perdido de Vila Velha

Já foram muito comuns as rendas de bilro no Espírito Santo. Existem relatos e imagens de mais de um século que registram as rendeiras na Barra do Jucu, Guarapari, Conceição da Barra, São Mateus e Colatina.

  • Manoel Goes É escritor, curador cultural e diretor no IHGES
Publicado em 20/07/2023 às 16h31

Ficou adormecido por muitos anos o ofício, a arte de tecer rendas em uma almofada com ajuda de bilros de madeiras, alfinetes e linha. Uma tradição da cultura popular canela-verde que estava quase perdida, digo quase porque ainda tivemos senhorinhas lideradas pela mestra Dona Rosinha (Rosa Leão Malta), falecida em 2019.

Ela foi responsável por manter nas famílias e nas amigas mais próximas ainda viva essa arte secular, que quase sucumbiu devido ao avanço da indústria têxtil. Uma nobre arte de sustento das famílias do litoral de Vila Velha, mais precisamente na histórica Barra do Jucu, que hoje através do atuante Grupo Barra da Renda, liderado desde 2016 pela incansável e talentosa arquiteta Regina Maria Ruschi, vem resgatando, renovando as rendeiras através de cursos e oficinas, tendo hoje no grupo mais de 60 rendeiras, dando destaque municipal e estadual a esse patrimônio cultural quase perdido.

Originária da Europa e trazida para o Brasil pelos portugueses, temos esse ofício espalhado mundo afora. Já foram muito comuns as rendas de bilro no Espírito Santo. Existem relatos e imagens de mais de um século que registram as rendeiras na Barra do Jucu, Guarapari, Conceição da Barra, São Mateus e Colatina.

Importante lembrar um dito popular de que “onde há renda, há rede”,  nas comunidades de pescadores cabia aos homens a pescaria, enquanto às mulheres teciam, e o lucro aferido se somava à renda para o sustento de famílias numerosas. Esse resgate cultural ainda cabe hoje às mestras de mais de oitenta anos, que estão repassando, para um grande contingente de mulheres jovens e até crianças, essa arte tão especial e única.

Mas a arte dos bilros já alçou voo mais alto, foi tema do “Projeto de Extensão Design Joia - Ufes”, por meio do seu Laboratório “LabDesignJoia” que realizou no mês de maio passado uma oficina participativa com as rendeiras de Bilro do Grupo Barra da Renda, na Barra do Jucu, com a participação também estudantes de diversos cursos da Ufes e profissionais ligados ao design de produtos, comunicação e marketing, e do ramo de joias.

O intuito dessa oficina foi apresentar aos participantes as possibilidades de desenvolvimento de joias a partir da nossa cultura local que envolve a renda de bilro, fomentando o seu valor cultural, a produção local, inclusão social e renda, sustentabilidade e identidade territorial. Esse projeto teve a coordenação do professor Marcos Antonio Spinassé.

A almofada, o cavalete, os bilros de madeira e as mãos habilidosas das rendeiras
A almofada, o cavalete, os bilros de madeira e as mãos habilidosas das rendeiras. Crédito: Divulgação

Fundamental conquista das rendeiras de bilro de Vila Velha foi ter aprovada, em maio de 2022, na Câmara Municipal a Lei nº 6.646, de autoria do vereador Joel Rangel, sancionada pelo prefeito Arnaldinho Borgo. A lei institui no calendário oficial do município o “Dia Municipal da Rendeira de Bilro” a ser comemorado anualmente no dia 20 de julho, data alusiva ao aniversário da grande mestra Dona Rosinha.

A comemoração será na Praça João Valadares, na Barra do Jucu, com a tradicional roda de rendeiras, exposição de produtos de renda de bilro, barraquinhas de gastronomia local e muita música, principalmente das casacas e tambores das bandas de Congo. Lá podemos presenciar a emoção dessas mulheres que resgatam a história capixaba, em um rico sitio histórico e importante celeiro cultural.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

A Gazeta integra o

Saiba mais

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.

A Gazeta deseja enviar alertas sobre as principais notícias do Espirito Santo.