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É mestre em Direito Processual pela Ufes, especialista em Direito Internacional e Direitos Humanos pela PUC-MG

Caso Robinho: cumprimento de pena no Brasil é um avanço civilizatório

A decisão do STJ fortalece a cooperação jurídica internacional e contribui, sobremaneira, para afastar a imagem de que o Brasil é o refúgio perfeito para a impunidade

  • Luiz Felipe Costa Santana É mestre em Direito Processual pela Ufes, especialista em Direito Internacional e Direitos Humanos pela PUC-MG
Publicado em 22/03/2024 às 15h04

No último dia 20 de março, o Superior Tribunal de Justiça, por intermédio de sua Corte Especial, homologou a sentença penal condenatória proveniente da Itália em face do ex-jogador Robinho, a qual condenou o atacante a nove anos de reclusão pelo crime de estupro coletivo contra uma jovem albanesa ocorrido no dia 22 de janeiro de 2013 em Milão. No dia seguinte, foi expedido ofício pela presidência do STJ para o cumprimento da prisão do ex-camisa 7 do Santos, o que de fato ocorreu na noite de quinta-feira (21).

A decisão do STJ, nesse caso, representa um avanço civilizatório importante no combate à impunidade em casos de brasileiros que cometem crimes no estrangeiro e, posteriormente, buscam retornar ao Brasil para fazer da garantia constitucional da não extradição de brasileiro nato (Art. 5º, LI, da Constituição Federal), como subterfúgio ao cumprimento das penas impostas por outras jurisdições.

Isso porque o ordenamento jurídico brasileiro nem sempre foi aberto à permissão para que penas advindas de poderes judiciários no exterior pudessem ser efetivamente cumpridas no país.

Havia uma compreensão – e ainda há para alguns juristas – de que, ao permitir que uma sentença penal condenatória estrangeira pudesse ser homologada e efetivada no território brasileiro, ocorreria uma violação à soberania nacional e ao princípio da territorialidade, pelo qual apenas o Poder Judiciário brasileiro teria jurisdição para cominar penas aos que se encontram dentro do Brasil.

Tal entendimento, no entanto, é anacrônico, pois não leva em consideração a inserção do país em um contexto globalizado, no qual o fluxo de pessoas, bens e serviços é altamente dinâmico e fluido.

De igual modo, essa interpretação descontextualiza o conceito de soberania, além de ser geradora de controvérsias, constrangimentos e impunidade, na medida em que não permitirá que um brasileiro que tenha cometido um crime no exterior seja entregue às autoridades do país que o condenou, em razão da garantia de não extradição, tampouco cumpra a pena no Brasil.

Não se pode esquecer que hoje o Brasil é um país de emigrantes, sendo que o número de brasileiros que vivem no exterior nunca foi tão alto. De acordo com o Itamaraty, a quantidade de nacionais vivendo no estrangeiro aumentou cerca de 35% entre 2010 e 2020, saltando de 3.1 milhões para 4,2 milhões de brasileiros fora do país.

Robinho na sede da Polícia Federal em Santos, onde foi preso após decisão do STJ
Robinho na sede da Polícia Federal em Santos, onde foi preso após decisão do STJ . Crédito: Reprodução/GE

E esse número pode ser ainda maior, em virtude da existência de emigrações não contabilizadas ou de pessoas que não estão legalizadas em outros países. Tal fato demonstra que o fluxo de nacionais é uma realidade inconteste.

Além disso, com a mudança constitucional que não mais retira a condição de brasileiro nato pela aquisição de outra nacionalidade, poderia haver um cálculo por parte do criminoso de que valeria a pena retornar ao Brasil após a prática delituosa no exterior, pois, em qualquer hipótese, não seria entregue às autoridades estrangeiras.

A decisão do STJ no âmbito da HDE nº 7986-IT, no entanto, encerra essa discussão, bem como fortalece a cooperação jurídica internacional e contribui, sobremaneira, para afastar a imagem de que o Brasil é o refúgio perfeito para a impunidade.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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