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É advogada, mestre em Direito pela PUC-MG, doutoranda em Direito e Garantias Fundamentais pela FDV

Assédio moral e sexual: marcas de uma violência socialmente produzida

Estatísticas revelam que algumas características se tornam marcas, que condicionam nossas possibilidades, tornando-nos mais vulneráveis à violência e às mais diversas formas de violações

  • Marcela Bussinguer É advogada, mestre em Direito pela PUC-MG, doutoranda em Direito e Garantias Fundamentais pela FDV
Publicado em 21/01/2022 às 02h00

Nascemos todos livres e iguais perante a lei. Mas a facticidade, o mundo da vida, contraria teimosamente a previsão legal.

Depositamos esperanças e construímos projetos de vida acreditando na igualdade, contudo, as estatísticas revelam que algumas características se tornam marcas, que condicionam nossas possibilidades, tornando-nos mais vulneráveis à violência e às mais diversas formas de violações. Assim, raça, gênero e classe são marcadores fundamentais para compreender quem são as principais vítimas do assédio moral e sexual.

Segundo levantamento “O ciclo do assédio sexual no ambiente de trabalho - Uma parceria Think Eva e LinkedIn”, quase metade das entrevistadas já sofreu assédio sexual, mulheres negras são mais atingidas do que as brancas, ocorrendo a maioria dos casos com aquelas que ganham até seis salários mínimos.

Mas, se o assédio é tão frequente, por que as denúncias não correspondem a esse elevado quantitativo? A subnotificação constitui grave problema no enfrentamento da questão. A inadequada naturalização de um comportamento masculino agressivo e desrespeitoso como se manifestasse mero “elogio” ou paquera; a construção de uma cultura de mulheres recatadas e não assertivas; o medo de que a divulgação do assédio repercuta negativamente em seus outros papéis sociais, como esposa e mãe; o medo da perda do emprego, ou de retaliações no emprego como transferência, perda de cargo ou função; o medo de que duvidem de sua palavra, de seu relato; o receio de ser culpabilizada; todos esses fatores reduzem significativamente o número de denúncias.

E a cada assédio praticado e não denunciado o assediador se fortalece, consolidando seu comportamento.

De igual modo, a erotização de profissões majoritariamente desempenhadas por mulheres, como professoras, enfermeiras, domésticas, entre outras, agrava o quadro, expondo tais profissionais a um risco aumentado em relação aos seus colegas homens no desempenho das funções.

Embora os indicadores revelem a cruel realidade de que a violência escolhe vítimas preferenciais, por meio deles podemos compreender que combater o assédio moral e sexual depende prementemente da reconstrução da classe, do fortalecimento das mulheres e do combate ao racismo.

O assédio produz marcas profundas em que sofreu a agressão, todavia, revela uma violência socialmente produzida e naturalizada em relação a categorias de pessoas, vulnerabilizadas pelos preconceitos.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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