Além de pautas de costumes e corrupção, Bolsonaro enfrentará a pobreza

A agenda emergencial é a pobreza e a miséria, mais do que a desigualdade. Mudar o foco das políticas sociais

Publicado em 20/09/2019 às 22h12

Favela da Rocinha, no Rio: pobreza será pauta das eleições

Antônio Carlos de Medeiros*

O presidente Bolsonaro controla a Agenda do país. E antecipou a campanha presidencial de 2022. Repete a sua narrativa de costumes e corrupção - e antipetista. Só que agora - e em 2022 - é inevitável a narrativa da pobreza e da desigualdade. Com 25 milhões de marginalizados no Brasil, este é um problema econômico, e não só de justiça social. O crescimento depende da inclusão social.

O índice de Gini, que mede a desigualdade, passou de 0,6003 em 2014 para 0,6291 em 2019. A concentração aumentou. Ao mesmo tempo, cresceu o número de pobres no país. O Brasil passou a ter 23,3 milhões de pessoas pobres em 2017. Não parou de crescer.

Esta questão da pobreza é crucial. Das desigualdades também. Com a clareza de que não se pode confundir desigualdade com pobreza. O importante para o bem-estar é quanto a pessoa ganha e não sua posição numa classificação.

A riqueza não é um recurso finito. Desde a Revolução Industrial ela se expande de forma exponencial: o produto mundial bruto cresceu quase 100 vezes entre 1820 e 2015. Os ricos se tornam mais ricos, mas os pobres também ficaram mais ricos. No mundo, e no Brasil, houve um inegável avanço civilizatório.

Entre 1990 e 2015, o mundo cortou pela metade a pobreza global, tirando 1 bilhão de pessoas da pobreza, com claras consequências positivas para o bem-estar: expectativa de vida, conhecimento, prosperidade, paz, segurança e outras dimensões do progresso. No Brasil, entre 1995 e 2015, houve grande redução relativa da pobreza e da miséria. A vida melhorou.

Verificar que a vida melhorou não é negar os problemas da economia mundial no século XXI. O crescimento é lento, a demanda caiu, o bem-estar estagnou ou caiu. A resultante tem sido um perfil de desigualdade interna nos países ricos que “espreme” a classe média. Na Ásia, África e América Latina a pobreza e a miséria diminuíram e classes médias se formaram.

No Brasil, a classe média voltou a diminuir. No agregado mundial, a perda de relevância da classe média afeta o ritmo do crescimento: ela era o motor do crescimento. Em toda parte, o crescimento é desigual. No capitalismo, o crescimento é intrinsecamente desigual. E agora diminuiu de ritmo.

As sociedades, como na Suécia, têm que consertar aquilo que o capitalismo não nasceu para fazer: cuidar da redistribuição. Aqui, a agenda emergencial é a pobreza e a miséria, mais do que a desigualdade. Mudar o foco das políticas sociais. Gastar mais para equalizar oportunidades e menos com transferência/proteção social. Priorizar o estímulo às crianças de zero a cinco anos de idade. Apoiar a educação infantil, nas famílias e nas creches. Pré-distribuir habilidades é a melhor estratégia para reduzir desigualdades, diz James Heckman. A essência do liberalismo é a igualdade de oportunidade.

*O autor é pós-doutor em Ciência Política pela The London School of Economics and Political Science

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