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Quase mil propostas de parlamentares capixabas são arquivadas

Quase mil propostas de parlamentares capixabas são arquivadas

Projetos podem voltar à pauta das Casas legislativas caso um parlamentar solicite; entenda

Publicado em 11 de fevereiro de 2019 às 02:09

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Congresso Nacional: proposições de capixabas foram para o arquivo. (Pedro França/ Agência Senado)

Ano novo de trabalhos enfim iniciados nas Casas legislativas dos Estados e no Congresso Nacional, o que também significou um ciclo de trabalho renovado, com a mudança de legislatura. E junto com a renovação, quase 1 mil propostas de parlamentares capixabas, reeleitos ou não, vão para o arquivo.

Isso porque tanto na Assembleia Legislativa quanto na Câmara dos Deputados e no Senado, o regimento interno prevê que ao final de cada legislatura devem ser arquivadas todas as proposições em tramitação, salvo algumas exceções.

Resumidamente, só não vão para o arquivo aquelas propostas que são de autoria de outro Poder, ou que estejam com a tramitação avançada, já tendo sido discutidas ao menos nas comissões.

Nesse contexto, 974 projetos dos capixabas devem acabar abandonados no meio do caminho. Alguns podem ser desarquivados por solicitação dos parlamentares.

Na Assembleia, são 372 arquivados. Na Câmara dos Deputados, onde mais de 16 mil propostas foram colocadas na gaveta, 434 são assinadas por algum dos 10 deputados federais do Espírito Santo, sozinhos ou em conjunto com outros parlamentares. No Senado, 168 projetos foram guardados.

Entre eles, a maioria são projetos de lei ou propostas de emenda à Constituição, mas há também muitos projetos de resolução, que são aqueles que servem para modificar as normas internas de cada Poder, e também projetos de decreto legislativo, que tratam de assuntos que são de competência exclusiva do Parlamento, entre outros.

Levando em consideração apenas a Assembleia Legislativa, nos últimos quatro anos 643 leis ordinárias foram aprovadas, enquanto 282 projetos de lei foram arquivados com a mudança de legislatura. O número de arquivamentos equivale a quase dois anos da produção de projetos, que, de fato, viraram leis, dos deputados estaduais.

Muitos nem foram apreciados pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Além disso, 44 deles estão pendurados na pauta da Assembleia desde 2016 e 38, desde 2015.

Na lista, estão projetos como o que regulamenta a escolha dos conselheiros do Tribunal de Contas pela Assembleia Legislativa; o que institui um sistema de identificação balística para elucidação de crimes no Estado; ou o que estabelece a proibição de fabricação, venda e comercialização de armas de brinquedo.

RAZÕES

O arquivamento automático de alguns projetos ao final da legislatura ocorre, principalmente, pela elevada quantidade de proposições que tramitam na Casa, de acordo com o secretário-geral da Mesa Diretora da Assembleia, Carlos Eduardo Casa Grande.

Embora os deputados que se reelegeram possam solicitar o desarquivamento, projetos que estavam em fase muito inicial de discussão podem não ter viabilidade para continuar tramitando.

“Um parlamentar novato não participou da tramitação no mandato anterior. Portanto, não conhece a matéria e não vai ter o conhecimento necessário sobre o tema para formar sua convicção de voto. Por isso, busca-se diminuir a quantidade de proposições em trâmite sem um representante para defendê-las. O arquivamento faz com que o Parlamento trabalhe com mais fluência, com menor quantidade de matérias, número que naturalmente vai crescendo ao longo do tempo”, explicou.

O consultor legislativo do Senado Federal e especialista em Ciência Política Arlindo de Oliveira ressalta que o que é considerado não é a relevância do tema, e sim a situação do projeto, já que os arquivados, em sua maioria, nunca entraram em pauta.

E de quem é a culpa por haver tantos projetos sem andamento?

Para Oliveira, três fatores interferem: o grande volume de projetos, o regime de tramitação extenso e o nível de interesse das pessoas envolvidas no processo legislativo.

A pauta das comissões pode adotar critérios como relevância da proposta, nível de estudos que ela demanda, realização ou não de audiências públicas, e propostas com teor muito provável de inconstitucionalidade.

“A pressão para que o projeto seja ou não apreciado pelas comissões é do próprio parlamentar. Se o autor não estiver satisfeito com a morosidade do seu projeto, pode diligenciar para solicitar o regime de urgência para a matéria”, destacou o consultor legislativo.

AS REGRAS

Arquivados

Critério

Todos os projetos que não foram concluídos na última legislatura, salvo exceções.

Assembleia

O que não é arquivado:

Projetos de iniciativa popular;

Projetos de iniciativa de outro Poder ou do procurador-geral de Justiça;

Mensagens encaminhadoras de vetos governamentais;

Projetos pendentes de aprovação de redação final. 

 

Câmara

O que não é arquivado:

Proposições que têm pareceres aprovados por todas as comissões;

Proposições que já foram aprovadas pelo plenário em primeiro turno, turno único;

Proposições que vieram do Senado ou que foram emendadas pelo Senado; Proposições de iniciativa popular;

Proposição oriunda de outro Poder ou do Poder Executivo.

Senado

O que não é arquivado:

Propostas originárias da Câmara;

Propostas de senadores aprovadas com alterações pelos deputados;

Temas sugeridos no último ano de mandato;

Propostas com parecer favorável das comissões.

CORRIDA PARA TIRAR PROJETOS DA GAVETA DOS LEGISLATIVOS

Para que as iniciativas dos parlamentares não sejam completamente desperdiçadas e algumas matérias garantam uma espécie de “sobrevida”, os deputados estaduais, deputados federais e senadores têm a possibilidade de pedir o desarquivamento de projetos de seu interesse.

E a corrida para garantir este retorno já começou. Na Assembleia Legislativa, por exemplo, 62 projetos já foram desarquivados nas duas primeiras sessões ordinárias do ano, realizadas na última semana.

Sergio Majeski (PSB) desarquivou 36 proposições; Janete de Sá (PMN), 17; Hércules Silveira (MDB), 5; e Rafael Favatto (Patriota), 4.

Majeski afirma que desarquivou praticamente todas as suas iniciativas. Ele avalia que o grande número de projetos que não tiveram parecer nem mesmo nas comissões deve-se ao mal funcionamento dos colegiados.

“Nos anos eleitorais, a Assembleia funcionou muito mal, as comissões não se reuniam, não tinham membros suficientes. A gente ainda esbarra com a falta de interesse dos deputados em alguns assuntos e a prioridade total dada às matérias do governo”, avaliou.

Na Câmara, no primeiro dia de trabalho legislativo, já houve 355 projetos protocolados, a maioria deles desarquivados. Um exemplo foi o do projeto que institui o Programa Escola sem Partido, agora sob o número PL 246/19, apresentado pela deputada Bia Kicis, do PSL do Distrito Federal. Na legislatura passada, uma comissão especial analisou a proposta, mas o relatório não chegou a ser votado.

Como desdobramentos da tragédia em Brumadinho, Minas Gerais, os deputados também já manifestaram interesse em desarquivar 25 projetos de lei da Câmara relacionados a barragens de mineração.

O prazo para desarquivamento das propostas é de 180 dias após o início dos trabalhos, tanto no Legislativo estadual quanto no federal. As propostas desarquivadas seguirão a tramitação do ponto em que pararam, ou seja, na comissão que a analisará ou no plenário.

Outros projetos, como o da reforma tributária e a proposta de emenda à Constituição (PEC) do foro privilegiado, por exemplo, não chegaram a ser arquivadas, já que a reforma tributária é oriunda do Executivo e a PEC do foro, do Senado.

Estratégia

O arquivamento de um grande volume de matérias pode ser considerado benéfico para o novo governo federal, que inicia suas políticas, e para as Casas legislativas, que têm nova composição, na avaliação do consultor legislativo do Senado, Arlindo de Oliveira.

“A amplitude maior de arquivamento é reflexo da grande renovação que ocorreu. Em decorrência disso, o cenário legislativo fica o mais renovável possível, para que os novos deputados e senadores possam construir as prioridades que considerem convenientes, desvinculadas de legislaturas anteriores”, destacou.

Com a estratégia de manter seus projetos em análise, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), eleito deputado federal, foi exonerado do cargo na última semana para desarquivar projetos. Ele “liberou” 108 matérias, das quais é autor ou coautor, durante seus quatro mandatos na Câmara, desde 2003.

Uma das iniciativas mais recentes é o projeto de decreto legislativo (PDC), assinado por Lorenzoni em parceria com Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), sobre o porte de armas durante voos. Ao menos uma dezena de outros projetos desarquivados por ele tratam sobre armas.

ANÁLISE: COMPETÊNCIA LIMITADA

Primeiro, é importante destacar que há um excesso de projetos de lei apresentados e é difícil que eles tratem de assuntos ainda inexplorados juridicamente. Na maioria das vezes, o que tem andamento são os projetos de autoria do Executivo, pois a competência do Legislativo é limitada e os parlamentares acabam tratando de temas periféricos, sem relevância. Isso ocorre no Congresso Nacional e é pior nos Estados. Além da dificuldade de percorrer o rito de aprovação de uma lei, há muitos projetos que possuem vícios de inconstitucionalidade, mas que são apresentados só para o parlamentar mostrar alguma produção.

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Mamede Said Maia Filho, Doutor em Direito e professor da UNB

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