Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

Di Ferrero: "Não me sinto mais maduro, me sinto mais seguro"

Di Ferrero lança "Uma Bad, Uma Farra", seu primeiro disco solo,  em uma nova fase na carreira e na vida, mas também em um retorno ao que o consagrou no NX Zero

Vitória
Publicado em 06/05/2022 às 01h42
Di Ferrero lança o disco solo
Di Ferrero lança o disco solo "Uma Bad, Uma Farra". Crédito: Bruno Trindade/Divulgação

Após o NX Zero anunciar sua pausa, em 2017, Di Ferrero se viu "sozinho" após 14 anos produzindo músicas com seus companheiros de banda. O músico se arriscou por caminhos que talvez não funcionassem para sua banda, gravando com Iza, Thiaguinho, Rashid, Rael, Vitão, Rashid e muitos outros. Di também lançou o EP "Sinais - Parte 1", projeto que depois acabou se desdobrando no "Sinais Sessions", uma série de parcerias que passeavam por diversos estilos. "Eu quis fazer músicas com pessoas diferentes", explica, por chamada de vídeo, antes de completar: "Isso é legal para singles, para fazer um álbum eu queria uma linha de raciocínio, uma identidade".

Di volta agora com seu primeiro disco solo, ": ( Uma Bad, Uma Farra :)" (assim mesmo, com as carinhas), disco composto por ele após sua mudança, de São Paulo para Florianópolis, e as experiências trazidas pela pandemia - ao voltar de uma viagem aos EUA, Di foi o primeiro caso confirmado de Covid em Santa Catarina. Essa conjunção acabou mudando os planos do músico, que acabou não lançado a segunda parte de seu EP. "Eu tive que mudar, não me identificava mais para fazer um 'dois' apenas pela obrigação de entregar".

": ( Uma Bad, Uma Farra :)" coloca Di Ferrero novamente lançando com banda. O disco, produzido pela equipe de Los Brasileros (Dan Valbusa, Pedro Dash - ambos da banda Cine - e Marcelo Ferraz), traz uma identidade contemporânea, com estética sonora e timbres que remetem aos grandes nomes da música pop, mas tem também uma pega mais pop punk que obviamente faz lembrar o NX Zero, como no já lançado single "Aonde é o Céu", e em "Fake Song", um punk direto, de 55 segundos, que encontraria boa companhia no primeiro disco do NX Zero, lançado ainda de forma independente.

O novo disco vem cheio de participações, como Badauí, do CPM 22, que canta com Di em "Um Brinde", Vitor Kley, parceiro em "Intensamente", Junior Lima, que toca bateria em "Amanhã quem sabe", e modelo/atriz/cantora Clarissa Müller, um fenômeno no Tik Tok com quem Di dialoga em "Descansa". "São pessoas que participaram da minha vida de certa forma nesse período e todas estão celebradas neste momento", pondera o músico.

": ( Uma Bad, Uma Farra :)" é um disco de vários momentos,  mas é um trabalho em que é possível sentir um otimismo, uma coisa mais "solar", como Di gosta de dizer. Ele credita isso ao fato de ter levado os produtores para Florianópolis ao invés de ir ao encontro deles se trancar em um estúdio. "Preferi que fosse lá pra casa pegar a vibe e a inspiração do lugar", lembra o músico, que também diz hoje escrever não apenas nos momentos tristes ou quando precisa desabafar, mas também quando está empolgado, feliz ou a partir de observações cotidianas.

Confira abaixo a íntegra da entrevista em que Di Ferrero fala sobre a produção do disco, o ressurgimento nostálgico do pop punk/emo dos anos 2000 e muito mais.

De quando são as músicas registradas no disco?

Eu diria que de um ano pra cá elas foram surgindo, foi pós-apocalíptico (risos), naquele momento de começar a pensar o que eu realmente estava a fim de fazer. Depois do "Sinais", que foi ótimo, uma vontade de fazer música com uma galera, entender como era depois de estar numa banda por tanto tempo fazendo música com as mesmas pessoas. Aí mudou tudo, todo mundo que tinha planos teve que se adaptar. Eu me mudei, fui pra Floripa, peguei um quarto de hóspede, coloquei um colchão na parede, uma mesinha de bar e montei um estúdio improvisado pra começar a fazer som, viajar. Foi ótimo porque eu descobri o que eu gosto, o que eu quero fazer. Foi tipo uma volta pra casa. Aí compus o álbum e veio o nome, "Uma Bad, Uma Farra", que foi essa montanha-russa de coisas que aconteceram.

Qual foi o papel dos produtores no disco?

Eu quis fazer um álbum inteiro com os mesmos produtores, com uma galera que soubesse da onde em vim, que conhecesse a cena em que eu comecei . Os caras eram do Cine, então conhecem bem esse mundo. É muito louco e eles hoje estão tocando comigo na tour. Eles vieram um pouquinho depois do NX Zero, vieram um pouquinho depois da gente, e o Dan Valbuza toca pra caramba, tem a mesma visão, e sabia o que eu queria fazer, essa coisa orgânica. Antes de mostrar pra ele eu fiz um esqueleto das músicas e ao invés de eu ir até eles em um estúdio, preferi que eles viessem pra Floripa e ficassem lá em casa comigo, pra pegar a vibe do lugar, a inspiração do lugar que a gente está pra compor, o que faz toda diferença. Tem muita coisa solar, pra cima, com energia, o que é legal. Antes eu fazia músicas mais em momentos tristes, quando precisava desabafar, mas agora fiz também na hora que eu tava empolgado, felizão, aí saiu a farra.

O disco realmente tem muito disso, quase que crônicas da sua vida, com uns momentos de alegria, outros de agradecimento. Como foi seu processo pra esse disco?

Eu percebi que quando eu estou compondo, quando me proponho a começar a fazer, eu sou bem observador e me inspiro em conversas, coisas do cotidiano. "Aonde é o Céu", por exemplo, saiu de uma conversa que eu tava tendo sobre cancelamento com um amigo meu. A gente estava discutindo e falei com ele "ah, já que você sabe tudo, me diz aí aonde é o céu". Aí gostei da frase, parei na hora e anotei (risos). Pra mim geralmente é de madrugada, tocando um som.. Eu comprei um baixo novo e fiquei tocando, tocando e percebi que tinha uma música de festival, com cara de pôr do sol. Por acaso eu vou tocar no Rock in Rio no horário do por do sol e com o Vitor Kley, que gravou comigo "Intensamente". Às vezes eu estou conversando com a Isabeli (Fontana, esposa de Di), como em "Calma", e comecei a escrever algo mais singelo. Fiz uma música pelo Facetime com o Vitor Kley, queria fazer uma música tipo uma valsa, ele falou uma frase, eu falei outra e foi. É o tempo inteiro buscando motivos pra fazer uma música, quando saio de casa pra almoçar, vejo filmes, leio livros e por aí vai.

Di Ferrero
Di Ferrero. Crédito: Bruno Trindade/Divulgação

O disco tem uma mescla legal de referências sonoras. Tem a identidade do Di do NX Zero, mas também tem algo mais contemporâneo. Era algo que você buscava?

Os caras são muito bons em tirar o que tô sentindo e eles me conhecem muito bem. Como falei, foi uma volta pra casa, pro conceito de banda. O "Sinais" eu fui fazer uma música em cada lugar. Fui fazer uma música no Rio de Janeiro e o dono do estúdio era filho da Elba Ramalho. Aí descobri que era na casa da Elba e perguntei se ela tava lá. Ela tava e ficamos conversando sobre ETs e saiu uma música. Eu quis fazer músicas com pessoas diferentes, fiz um rock'n'roll com a galera do funk... Isso é legal pra fazer singles, mas pra fazer um álbum eu quis uma linha de raciocínio, uma identidade. Eu mostrei pros meus amigos e eles falaram que agora sim tinha minha cara, e isso foi me dando segurança. Ao vivo tá com punch, tá com porrada, e não deixa de ser uma novidade também.

O que foi o "movimento emo" no Brasil tá voltando agora com certa nostalgia, né?

Na verdade é muito louco porque a galera que viveu esse movimento emo/hardcore/pop punk dos anos 2000 tem isso marcado, ela continua ouvindo. Tem muita gente que nunca nem foi a show nenhum e agora quer ir. Eu vejo pelos festivais que eu mesmo tô tocando que tem uma linguagem de rock em sons como rap, trap, reggae, porque não é o rock com guitarras e tal, mas outra linguagem, a atitude, o jeito, e isso é o rock também. Muita gente que faz outros sons é fã disso (emo) e dá a oportunidade de uma galera nova vir, com um novo movimento que se mistura com o que foi o emo, que hoje é superlegal falar que é emo e na época era pejorativo. Tá pipocando artista novo, festivais, e isso é muito legal. Tô sentindo um movimento muito legal crescendo não só no Brasil, não só a influência do ano 2000, como o Machine Gun Kelly, o Yungblud tem uma pegada meio Billy Idol, mas tem também uma galera tipo o Måneskin, que é uma banda de glam rock. É legal ver isso porque você vê uma galera querendo colocar guitarra, bateria...

Nesse novo rap americano tem muita influência das bandas de pop punk, tem muita linha de vocal que se encaixaria em músicas do Blink-182, por exemplo...

O Post Malone mesmo fazia bases de rap e trap com uns berros, com estrutura de rock. Essa separação quem faz muito é o rock. Eu lembro quando o NX saiu, muita gente abraçou, mas muita gente virou a cara, falando que "acabou o rock", como vem acabando há décadas, né (risos). A minha geração já é diferente, é uma coisa mais eclética. O Badauí, que tá no álbum, foi um cara que abraçou a banda. O primeiro show de estádio que a gente fez foi em 20 minutos de um show do CPM 22, ele quer fazer rodar a parada, o Chorão foi assim também, então eu também quero fazer esse rolê, colocar as bandas pra rodar. Eu vejo que eu estou tocando em vários festivais com Iza, Thiaguinho, CPM, eu... Tudo muito misturado dentro do mundo pop.

Di Ferrero

Músico

"A gente (NX Zero) era uma banda que veio do underground, mas de repente virou quase uma boy-band. Tinha gente que acampava na frente da minha casa, sabe?"

O disco chega num momento em que o mercado deu uma mudada, com uma predominância de singles, com as músicas bombando no Tik Tok. O disco tem a participação da Clarissa, que é bombada no Tik Tok, é um aceno a essa galera?

Eu tenho tentado não fazer nada que não esteja na minha essência, não quero soar forçado. Eu penso muito nos meus ídolos nessas horas. O Chorão faria isso? Eu conseguiria fazer isso de uma forma natural? Não sei, talvez. Eu venho de um outro momento, então tenho a sorte de "já existir", de se rum artista. É claro que é um trampo novo, um trampo solo, mas eu já tenho uma história. Eu tenho que entender de onde eu vim e quem eu sou, mas também não posso falar "não vou fazer essa merda aí e que se foda". É interessante, são maneiras de comunicação. Eu lembro de ver os clipes do Foo Fighters, clipes de bandas de hardcore, da galera do skate, com várias coisas bem-humoradas, nonsense, e essas coisas eu consigo fazer, é algo natural pra mim.

O público do seu show hoje é a galera que era fã do NX Zero e hoje te acompanha solo ou tem uma galera nova chegando?

Tem a galera que cresceu ouvindo o NX e agora, neste momento, já desapegou daquela coisa de reclamar da pausa da banda e quer ouvir as músicas, quer cantar as do NX, as novas. Tem uma galera que era fã e nunca foi no show. A gente era uma banda que veio do underground, mas de repente virou quase uma boy-band. Tinha gente que acampava na frente da minha casa, sabe? Aí tinha a galera que curtia o som e ficava puto com os fãs novos. Hoje eles já se misturam e tá todo mundo tranquilo quanto a isso. Eu acredito é que nesse momento de quase pós-pandemia, ninguém tá muito preocupado com o que foi ou o que é, todo mundo quer cantar uma música, ir a um show e dar um rolê. A gente tava perdendo tempo com besteira.

Você curte muito parcerias, né? O projeto "Sinais" mostrava isso e o álbum novo também tem. Como foram pensadas essas parcerias?

O Badauí eu sempre quis fazer. Eu já tinha cantado com ele várias vezes, inclusive eu invado o palco deles sempre, mas a gente nunca tinha feito um som novo aí tem essa música que tem o aval dele, "Um brinde". A Clarissa, em "Descansa", eu tava procurando uma voz feminina, não necessariamente uma voz de mulher, mas uma voz que contrastasse com a minha pra essa conversa que é a música. Eu ouvi a voz dela, um sotaque carioca e tem uma coisa meio introspectiva, meio sexy. O Júnior Lima é meu irmão, multi-instrumentista, toca muito, tem uma cabeça de produtor, saca muito de música. Ele pensa diferente. Quando eu mostrei a música pra ele, sem batera, ele pensou: o que o som precisa? Ele não é aquele batera que vai fazer um monte de coisa (faz sons de viradas de bateria), ele vai pegar a música inteira e dizer do que a música precisa. O Vitor Kley também é um irmãozão meu. Eu fui morar em Floripa e ele é de Itajaí, ele foi lá em casa, chamei ele pra cantar outra música, "Sorte", mas ele escolheu a que ele queria. Tem também os caras do Los Brasileiros, que são dois dos caras do Cine, então foram pessoas que participaram da minha vida de uma certa forma e estão celebradas neste momento.

Você lançou o "Sinais Parte 1" e não teve a segunda parte.Virou o "Sinais Sessions"?

Como tudo, eu tive que mudar. Eu não me identificava mais pra fazer um "dois" só pra entregar uma parada como artista. A pandemia veio... sei lá. Eu fiquei rouco fui o primeiro caso de covid em Santa Catarina, foi uma loucura.

Esse disco tem um Di Ferrero mais maduro, mais pronto como artista solo?

Na real eu não sei se me sinto mais maduro, acho que não (risos). Acho que eu tô menos maduro, mas isso é melhor porque eu me desprendo dessa coisa de ter que fazer alguma coisa específica. Quando o cara diz que tá mais maduro, ele começa a tocar um violão, fazer um acústico, e eu tô numa fase em que não aguento ouvir um violão de nylon (risos). Eu acho que tô querendo mais é gritar, ir pra rua, e já tô pensando em uma outra parte do álbum, com uma sonzeira, misturar com mais gente. Nessa fase da minha vida, um álbum é algo muito grande. Eu tenho 36 anos e apesar de ter lançado muita coisa, nunca fiz um álbum com o meu nome. Não sei se estou mais maduro, mas estou mais seguro pra fazer um som, pra dar a cara a tapa, pra ir pra rua e tocar.

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