Publicado em 12 de agosto de 2023 às 10:32
A Polícia Federal classificou como "operação resgate" a movimentação sigilosa de alguns dos principais auxiliares do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para reaver nos Estados Unidos joias que haviam sido vendidas, mas que para autoridades brasileiras pertencem ao patrimônio público.>
No dia 15 de março, o TCU (Tribunal de Contas da União) havia determinado que o material fosse devolvido ao governo brasileiro. >
Participaram do movimento, segundo a PF, o tenente-coronel do Exército e ex-chefe dos ajudantes de ordem de Bolsonaro, Mauro Cid, o seu assessor Marcelo Câmara, o segundo-tenente Osmar Crivelatti e o advogado Frederick Wassef.>
A investigação mostra que eles se articularam para recuperar o "kit ouro Branco", entregue ao ex-presidente em sua visita oficial à Arábia Saudita em outubro de 2019 e incorporado ao seu acervo privado.>
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O conjunto era composto de um anel, abotoaduras, um rosário islâmico ("masbaha") e um relógio da marca Rolex, produzido em ouro branco e diamantes. Os aliados do ex-presidente teriam dividido a operação em duas etapas, segundo a PF.>
O relógio Rolex Day-Date, vendido à empresa Precision Watches, na Pensilvânia, Estados Unidos, foi recuperado no dia 14 de março por Wassef. Ele teria comprado de volta o objeto.>
Após o "resgate", o advogado teria retornado com o bem ao Brasil no dia 29 de março e entregue a Mauro Cid quatro dias depois, em São Paulo. O tenente-coronel então retornou a Brasília na mesma data e entregou o relógio a Crivelatti.>
A PF identificou registros de interação entre Cid e Wassef para tratar do assunto, apesar de o primeiro ter apagado a maior parte das mensagens.>
O órgão confirmou que Wassef embarcou no dia 11 de março de Campinas (SP) para a Flórida.>
O restante das joias, segundo a PF, foi recuperado por Cid em 27 de março, durante viagem a Miami.>
Em junho de 2022, ele havia visitado o mesmo local para vender (ou expor à venda) o restante dos itens do Kit Ouro Branco, segundo a PF.>
Em 15 de março, Cid também conversou com o ex-secretário de Comunicação da Presidência Fabio Wajngarten sobre a possibilidade do TCU pedir o retorno do material.>
Wajngarten respondeu: "Vão mesmo. Por isso era muito melhor a gente se antecipar". Em seguida, demonstrando contrariedade, ele critica o assessor e o advogado de Bolsonaro: "Mas o gênio do [Marcelo] Câmara + Fred [Wassef] contaminam tudo".>
A polícia também achou mensagens que mostraram o nervosismo de Cid e Marcelo Camara ao tentar recuperar o kit.>
Chamou atenção da polícia o diálogo trocado no dia 26 de março, em que Cid afirma não estar confiante. Em resposta, Camara diz: "Acredita soldado". Um dia depois, Cid encaminha a mensagem a Crivelatti "Resolvido!", ao que este responde: "Excelente"; "Ihuuuuuu".>
Após isso, Cid solicita documentos que comprovariam o registro dos bens no acervo privado do ex-presidente para apresentá-los caso fosse parado em alguma fiscalização no aeroporto.>
Após recuperar os bens, segundo a PF, ele retornou imediatamente ao Brasil, chegando na manhã do dia 28 de março em Brasília, quando também repassou o material a Crivelatti.>
De acordo com a polícia, "há robustos elementos de prova no sentido que os bens extraviados foram objeto de verdadeira operação resgate, com objetivo de esconder o fato de que haviam sido alienados".>
"Cabe salientar que toda a operação foi realizada de forma escamoteada, fato que permitiu aos investigados devolverem os bens sem revelar que todo o material estava fora do país, ao contrário das afirmações prestadas", disse o órgão.>
A polícia também relatou que a operação encoberta permitiu que, até o presente momento, as autoridades brasileiras não tivessem conhecimento que os bens foram vendidos no exterior, "descumprindo os normativos legais, com o objetivo de enriquecimento ilícito do ex-presidente Jair Bolsonaro, e posteriormente recuperados para serem devolvidos ao estado brasileiro".>
O conjunto foi devolvido em 4 de abril em uma agência da Caixa Econômica Federal em Brasília, conforme determinação do TCU.>
Na ocasião, Wajngarten afirmou, em uma rede social, que a "entrega reitera o compromisso da defesa do presidente Bolsonaro de devolver todos os presentes que o TCU solicitar, cumprindo a orientação do ex-mandatário do país, que sempre respeitou a legislação em vigor sobre o assunto".>
O presidente do TCU, ministro Bruno Dantas, afirmou que Bolsonaro não poderia ficar com as joias e que, para um presente ser incorporado ao patrimônio privado de um presidente, deveria ser classificado como item personalíssimo e ser de baixo valor.>
A polícia não achou indícios de que um segundo relógio, também vendido para a loja na Pensilvânia em 13 de junho de 2022, tenha sido recuperado pelos investigados.>
Anteriormente, um conjunto de itens masculinos da marca Chopard teria sido resgatado de uma loja em Nova York e encaminhado, por meio do serviço de transporte de mercadorias para um endereço na cidade de Orlando, local em que o ex-presidente estava hospedado.>
Em seguida, o kit foi transportado para o Brasil e entregue em 24 de março na agência da Caixa, em Brasília.>
A defesa de Bolsonaro afirmou que o ex-presidente coloca sua movimentação bancária à disposição das autoridades e que ele "jamais apropriou-se ou desviou quaisquer bens públicos".>
Disse ainda, em nota, que ele "voluntariamente" pediu ao TCU em março deste ano a entrega de joias recebidas "até final decisão sobre seu tratamento, o que de fato foi feito".>
Procurado, o advogado de Mauro Cid, Bernardo Fenelon, disse em nota que ainda não teve acesso aos autos da investigação que ocasionou as buscas e apreensões. "Por esse motivo não temos como fazer qualquer comentário, afirmou.>
Fabio Wajngarten disse em rede social que no diálogo mantido com Mauro Cid, reportado pela Polícia Federal, se referia "à entrega voluntária das joias ao Tribunal de Contas da União".>
"Quando disse que se devia 'antecipar' a entrega dos objetos estou me referindo a uma remessa antecipada à Corte, antes de um pedido formal do TCU, que aliás acabou ocorrendo.">
Frederick Wassef ainda não se pronunciou a respeito.>
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