É preciso ser racional e realista para a violência reduzir efetivamente

Se quisermos reduzir da violência, nós é que teremos que ser mais racionais, realistas e sutis

Publicado em 20/09/2019 às 22h05

Redução da violência

Henrique Geaquinto Herkenhoff*

Misturando o Hedonismo da Grécia Clássica, o Sensualismo de Condillac e o Utilitarismo de Stuart Mill, pensadores como Adam Smith e Bentham imaginaram um ser humano abstrato, puramente racional, perfeitamente informado, egoísta e livre, cujo comportamento pudesse ser estudado e previsto. Só então Economia surgiu e se firmou como ramo autônomo do conhecimento, com a formulação de leis universalmente aceitáveis.

Para que essa ideia fosse levada à Criminologia e às políticas criminais, foi um pequeno passo: supondo que o indivíduo sempre tentaria maximizar o ganho e o prazer, minimizando o custo e o sofrimento, e que ele sempre agiria de maneira estritamente lógica, a decisão de cometer ou não um delito seria decorrência simples e direta da relação entre o proveito comparado aos riscos e à gravidade da punição.

Isto foi revolucionário em relação ao passado, mas aprisionou o conhecimento em um modelo ficcional: embora o comportamento das massas se aproxime mais desse padrão (fenômeno conhecido como “sabedoria das multidões”), o indivíduo de carne e osso é simplesmente irracional a maior parte do tempo.

A partir de trabalhos de pioneiros como Edgeworth, Pareto e Tarde, amalgamando contributos da Psicologia, da Neurociência e da Microeconomia, a Economia Comportamental mostra, por exemplo, como a aversão ao risco de uma perda é maior do que o desejo de ganho da mesma quantia, levando Daniel Kanemann ao Nobel de Economia em 2002. Não, o ser humano não é essencialmente racional, mas isso não implica que ele seja imprevisível ou não-influenciável por políticas criminais, por exemplo. Apenas ele não fará as escolhas nem se deixará levar pelos fatores que o senso comum imagina.

Se nem o cidadão médio age como um homo oeconomicus, que dirá o criminoso. Quem ingressa no tráfico ganhará inicialmente próximo a dois salários mínimos, mas sem férias, 13º etc. Essa pessoa faz conscientemente uma escolha que não apenas a afasta da sociedade, mas que implica morte prematura e prisão (sobrevida estimada de 3,5 anos, dos quais 2 no cárcere), e que só começará a trazer algum ganho econômico se ela for uma das poucas a fugir dessa média.

Tudo bem que ela não tem dados precisos nem faz raciocínios elaborados, mas é uma tolice imaginar que quem conta morrer em cada esquina está preocupado com o tamanho das penas previstas em leis que ela não sabe ler. Se quisermos reduzir da violência, nós é que teremos que ser mais racionais, realistas e sutis.

*O autor é professor do mestrado em Segurança Pública da UVV

A Gazeta integra o

Saiba mais
crime

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.

A Gazeta deseja enviar alertas sobre as principais notícias do Espirito Santo.