Publicado em 12 de maio de 2023 às 15:27
A descoberta recente de um esquema de manipulação nas apostas esportivas em sites colocou em xeque a reputação do setor no Brasil.>
O esquema, agora investigado pelo Ministério Público de Goiás com o nome de Operação Penalidade Máxima, pagava jogadores de futebol para mudar, dentro de campo, o rumo das partidas - levando cartões amarelos, sendo expulsos ou cometendo pênaltis, por exemplo.>
Embora os envolvidos na manipulação dos resultados possam responder criminalmente, o ato de apostar nesses sites, que têm se tornado cada vez mais populares, assim como disponibilizar as apostas, não é considerado crime no Brasil.>
Mudanças recentes na legislação brasileira diferenciam os jogos de azar das apostas em jogos esportivos feitas online — mas, na avaliação dos especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, ainda há brechas que necessitam de regras específicas. >
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"Originalmente, a legislação brasileira tratava todos de maneira igual. O artigo 50 da Lei de Contravenções Penais estabelece que fazer apostas é uma contravenção penal, punível com prisão simples de 15 dias a 3 meses, ou multa", diz Fabiano Jantalia, especialista em direito de jogos e bancário. >
A lei considera os jogos de azar três tipos: jogos em que o ganho ou a perda dependem da sorte; apostas sobre corridas de cavalos ou apostas sobre qualquer outra competição esportiva. >
"Com a criação da Lei 13.756, em 2018, uma nova modalidade de loteria foi criada, o que acarretou uma mudança na classificação das apostas de quota fixa no Brasil, que são, na verdade, as apostas esportivas, passaram a ser enquadradas como loteria, o que no Brasil é considerado um serviço público. A partir daí criou-se uma bifurcação", aponta Jantalia. >
"O problema é que esta mesma lei previu a possibilidade de sua exploração, mas condicionou isso a uma regulamentação futura. E essa regulamentação, até o dia de hoje, não ocorreu. Embora tenham sido permitidas, as apostas ainda não podem ser exploradas no Brasil devido à falta de regulamentação específica.">
Por falta de regulamentação específica, empresas do setor têm encontrado maneiras de evitar sanções em solo brasileiro. >
"A maioria dos sites de apostas estão sediados no exterior, fazendo com que fiquem alheios à legislação brasileira, dificultando a tributação, fiscalização e até garantia de direitos dos usuários", diz Marcelo Mattoso Ferreira, advogado especialista no mercado de eSports e games, e sócio do escritório Barcellos Tucunduva Advogados.>
O promotor Felipe Almeida Marques, coordenador do Núcleo de Crimes Cibernéticos no Ministério Público do Mato Grosso, explica que para empresas de outros tipos de apostas, sediar empresas em outros países é uma manobra comumente adotada.>
"Além de evitar a fiscalização e punição, a menor tributação em paraísos fiscais tornou esses locais mais atraentes para a instalação de cassinos e similares." >
"Na verdade, esse é um movimento mundial que a legislação brasileira não está acompanhando, e não é possível vedar o acesso e a hospedagem desses sites de maneira local. Assim, resta apenas a regulamentação, a tributação e fiscalização como forma de diminuir possíveis impactos negativos.">
O que o governo brasileiro avalia agora é a edição de uma Medida Provisória que consiga suprir a lacuna existente hoje, que é a falta de regulamentação pelo Ministério da Fazenda.>
"Pelo que parece, o governo está estudando elevar o assunto ao nível de uma medida provisória, porque entende que são necessários aprimoramentos em relação à sanção, e a uma série de procedimentos administrativos, desde a obtenção, que vão desde a obtenção de licenças e autorizações, até mesmo as punições e possibilidade de termo de compromisso e outras ações administrativas", afirma Jantalia.>
O especialista em direito de jogos descreve pontos que considera que ainda estão em falta na legislação.>
Tributação>
"É preciso saber como será a tributação dos prêmios dados aos apostadores que ganham, assim como quais serão as regras da tributação das casas de apostas que buscarão autorização para funcionar no Brasil", diz Jantalia.>
Autorização>
Outro ponto, explica o advogado, é a necessidade de definir quanto a empresa precisará pagar para ter a licença que permite acesso a esse mercado e quais tipos de documentos ela deverá apresentar.>
Regras sobre jogo responsável>
O conjunto de regras que vai orientar a atuação desses agentes também deve ser estabelecido pelo Ministério Público. "São necessárias regras de prevenção à lavagem de dinheiro que precisarão observar uma disciplina específica do setor, e até procedimentos de autoexclusão que visam permitir que o apostador voluntariamente se auto proíba de jogar porque ele se considera viciado.">
Fiscalização>
Qual será a estrutura administrativa que será criada para fiscalizar esse setor também permanece como dúvida. >
"No mundo inteiro, o setor de jogos é um dos mais regulados, mesmo se comparado, por exemplo, ao setor financeiro, porque ele tem uma série de peculiaridades que precisam ser observadas. Então, a grande expectativa é como se dará esse aparato de fiscalização - se vai ser uma Secretaria, agência, autoridade nacional…", conclui Jantalia.>
"É óbvio que sempre haverá tentativas e esquemas para corromper a integridade dos atuantes daquele mercado, mas o mínimo que se pode fazer é implementar mecanismos de redução desse risco e isso, via de regra, só vem com regulamentação eficiente", acrescenta Ferreira.>
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