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'Controle o seu futuro para depois ajudar os filhos', alerta psicólogo

"Controle o seu futuro para depois ajudar os filhos", alerta psicólogo

O psicólogo e psicoterapeuta Thalles Contão responde a dúvida da leitora, e afirma que em certas situações na vida o poder dos pais perante filhos se restringe somente a própria existência

Publicado em 23 de julho de 2019 às 14:26

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É preciso ter controle sobre o próprio futuro, para depois tentar ajudar aos filhos, diz psicólogo . (Reprodução/ Unsplash)

PERGUNTA: GLÓRIA MARIA 

"Tenho uma filha de 22 anos. Já fiz de tudo pra que ela tenha um futuro, e nada parece surtir efeito. Já abandonou duas faculdades e só quer saber de 'rock'. Não tenho mais vida e não posso dividir este peso com ninguém mais, já que não tenho contato com o pai dela. Hoje tenho 38 anos, e parece que minha vida acabou. Como faço para conseguir fazer minha filha ter um rumo na vida?".

Antes de uma resposta, cara leitora, você merece meus parabéns! Assumir a integral responsabilidade de uma recém-nascida aos 16 anos, nos anos noventa, é um feito hercúleo quando levamos em consideração que o pai foi mero acessório reprodutivo. Mas seu feito nos serve de ocasião. Já pensou o que a levou a assumir tamanha responsabilidade? Sei que diversas vezes não pôde pensar durante essa caminhada na qual teve que crescer à força.

Mas se pensar comigo agora em tudo o que aconteceu, não poderá acreditar, nesse contexto, que a responsabilidade de assumir a criança surgiu do nada, ou que o senso de responsabilidade já existia antes do fato. Se ele existisse antes com a força que te levou a criar sua filha sozinha, sua filha não estaria aqui.

A gravidez não foi algo planejado dentro de uma estrutura familiar, você era uma adolescente e, na maioria dos casos, uma gestação assim é interrompida. Também podemos aventar a possibilidade dos seus pais assumirem a responsabilidade no seu lugar, o que é o mais comum em casos assim. Mas nenhuma das duas coisas aconteceu, e com toda certeza isso se deve ao fato de que você não teve opções diante daquela situação. Seus pais te fizeram assumir a criança e você respondeu a isso com responsabilidade, porque, provavelmente por valores familiares nos quais fora criada, não se resolve uma irresponsabilidade com outra. Então teve que lutar, abrir mão de várias coisas, teve que crescer e enfrentou diversas dificuldades para chegar até aqui.

Mas chegou! E amou essa criança, encontrou felicidade na maternidade e, por tabela, conseguiu outras coisas que provavelmente amigas suas não conseguiram, porque “crescer” bateu mais tarde na porta delas. Cara leitora, não é sua filha que precisa de um rumo na vida. Se ela for exposta às necessidades vigentes, cedo ou tarde, vai ter um rumo – mesmo que não seja o que deseja para ela. Quem verdadeiramente está precisando de uma rumo nessa história é você. Por mais que seja desesperador para uma mãe dedicada ver a filha fazendo escolhas erradas, entenda que há certas situações na vida em que nosso poder se restringe a somente a nossa existência.

É o seu poder que você negligencia, acreditando que essa adolescente irresponsável é aquele bebe que só podia contar com você e para quem decidia todas as coisas. Você acredita na fantasia materna de que a falta de rumo dela é impotência, quando na verdade é mimo pós-moderno. Se ela só quer saber de “rock”, ela sabe o que quer, mesmo que isso te frustre. Aliás, curiosamente, ela não se frustra nunca?, inclusive por abandonar faculdade e seguir no “rock”.

Se quer mesmo ajudar sua filha, ajude a si mesma, pois uma jovem, aos 38 anos, não deveria acreditar que sua vida acabou. Principalmente tendo chegado até aqui diante de todos os problemas que teve. Você está fazendo um caminho reverso da maioria do nosso tempo. Está fazendo a responsabilidade pessoal diante da história de uma filha na adolescência se transformar em uma grande ato de irresponsabilidade para consigo própria, uma prisão traumática descolada no tempo. Cara leitora, o único futuro que realmente pode controlar é o seu, e, fazendo isso, acredite, vai dar chance para que sua filha se responsabilize pelo futuro dela também.

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