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Unidos em tempos de pandemia, nadadores apontam avanços e lacunas no Dia do Atleta Paralímpico

Unidos em tempos de pandemia, nadadores apontam avanços e lacunas no Dia do Atleta Paralímpico

Focados nos Jogos de Tóquio, Philipe Rodrigues e Wendell Belarmino celebram conquistas para as pessoas com deficiência, mas veem discurso de coitadinho voltar a ganhar fôlego...

Publicado em 22 de setembro de 2020 às 14:25- Atualizado há 4 anos

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(Washington Alves/MPIX/CPB; Douglas Magno/EXEMPLUS/CPB)

Phelipe Rodrigues, 30 anos, é multimedalhista paralímpico na classe S10. Wendell Belarmino, 22 anos, da classe S11, está classificado para a Paralimpíada de Tóquio 2021. Os nadadores e campeões mundiais nos 50m livre (Phelipe no México, em 2017, e Wendell em Londres, em 2019) celebram nesta terça-feira o Dia Nacional do Atleta Paralímpico – um dia após também se celebrar o Dia Nacional de Luta do Direitos da Pessoa com Deficiência. E fazem uma avaliação crítica sobre os avanços e as lacunas sobre o assunto no país.

Veterano em Jogos (Pequim-2008, Londres-2012 e Rio-2016), Phelipe vê a data como uma das mais importantes para as pessoas com deficiência.

- Hoje é um dia que temos protagonismo para ressaltar como o esporte é uma forma de você começar a perder a vergonha do próprio corpo, como foi para mim. Acredito que atividade física, independentemente se é de alto rendimento ou não, tem o poder de ser um propósito para uma pessoa com deficiência sair de casa - comentou o nadador pernambucano, que nasceu com má-formação congênita no pé direito.

Phelipe também acreditava que os Jogos Rio-2016 seriam um divisor de águas em como a sociedade iria enxergar às pessoas com deficiência.

- Depois de 2016 demos um salto gigante, mas nos anos seguintes o que vimos foi uma esfriada. O discurso do ‘coitadinho’ voltou a ter mais fôlego e tudo o que nós não queremos é sermos vitimizados. Somos um grupo de pessoas das mais esforçadas, nós só precisamos das ferramentas certas. Ninguém mais do que nós queremos nos igualar as pessoas 'ditas normais - afirma.

Wendell tem uma opinião semelhante ao do amigo Phelipe.

- O Brasil melhorou muito em reconhecer as pessoas com deficiência como pessoas ‘normais’, mas ainda precisa evoluir. Nós só precisamos de acessibilidade. E o esporte é uma ótima ferramenta porque mostra que podemos fazer tudo o que a gente quiser realizar - garante o jovem brasiliense que já no último ano conquistou seis medalhas parapan-americanas e três no campeonato mundial.

Wendell passou uma temporada de um mês e meio com o Phelipe durante a pandemia do novo coronavírus. A convite do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), o nadador residente da capital federal treinou no Centro de Treinamento Paralímpico, em São Paulo, entre os meses de julho e agosto, e precisava de um lugar para ficar. Phelipe imediatamente abriu as portas do seu então apartamento de dois quartos, alugado a sete minutos do CT, para o atleta com deficiência visual e o treinador dele, Marcus Lima.

- Foi bem legal ter os dois lá em casa nesse período. Eu acredito que a gente pode aprender um pouco a cada dia e nesses quase dois meses com o Wendell não foi diferente. A gente aprendeu muito um com o outro. A deficiência dele é diferente da minha e mesmo convivendo há anos com pessoas com deficiência visual é diferente de você morar com alguém nessas condições - conta Phelipe.

Ele também revela situações do dia a dia, como esquecer de tirar um frango ou uma carne do congelador e só se dar conta disso na hora da refeição.

- Ele queria pedir comida. Tudo bem, estamos em um grande centro, tem entrega fácil, mas atleta precisa de dieta regrada. Precisa de rotina. Só que ele nunca tinha vivido uma situação como essa e foi importante para ver que o dia de um atleta não se resume a nadar, ir a academia e fazer fisioterapia. Precisamos estar atentos com tudo que está à nossa volta - aconselha Phelipe que afirma que proibia as entregas de comida na casa dele para o bem de todos.

Esse período funcionou como um intensivão já de olho em Tóquio.

- Fui falando também para eles como foi minha experiência nas outras Paralimpíadas. Ele vai chegar em Tóquio com um pouco mais de informação, sem se deparar com algo inesperado como foi comigo em Pequim - relembra.

Para Wendell, ouvir as experiências do maior medalhista brasileiro em Lima, no ano passado, foi essencial.

- O Phelipe é um cara muito solícito. Não é qualquer um que abre a sua casa por tanto tempo, mesmo me conhecendo - avalia.

Eles já se conheciam de se esbarrar em competições desde 2018, mas só ganharam mais intimidade durante os Jogos Parapan-Americanos de Lima e depois no Mundial, em Londres.

- Passar esse tempo com o Phelipe me fez aprender bastante. Ele tem o método dele e divide isso com outras pessoas. Generoso, não se preocupa só em ter o sucesso para ele. Se deu certo para ele, não se esquiva em dividir essa experiência. Me mostrou cada medalha que tem. Eu me sinto mais preparado para gerenciar meu nervosismo e manter o foco nas provas por meio das experiências dele - confessa o ganhador do prêmio de atleta revelação do Prêmio Paralímpicos 2019.

Enquanto não há calendário de competições confirmadas para os próximos meses, Phelipe mantém uma rotina de treinos de segunda a sábado no CT Paralímpico e se diz ansioso para ser convocado. Apenas uma medalha de ouro no mundial de Londres no ano passado garantia uma vaga para Tóquio. Phelipe ficou com a prata nos 50m livre e, neste ano, não teve oportunidade para buscar o índice estabelecido pelo CPB.

As competições foram canceladas com a pandemia e, mesmo em primeiro lugar no ranking mundial do IPC (Comitê Paralímpico Internacional, sigla em Inglês), o nadador brasileiro precisa aguardar as próximas competições e os critérios de convocação do CPB.

- Ser convocado para uma Paralimpíada é o que todo atleta almeja. Pra mim não é diferente, mesmo sendo minha quarta participação. O que eu sei é que eu treino muito e estou bem motivado para dar o melhor de mim - garante o veterano.

Já o novato não vive o nervosismo da convocação.

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- Mas, sem competições tão frequentemente, não nego que vi a necessidade de fazer um reforço no acompanhamento nutricional e psicológico - revela o jovem, que mesmo nadando há quase 10 anos, só acreditou nessa possibilidade quando se tornou campeão mundial, em Londres.

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