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Memórias da 'mãe' capixaba de Ayrton Senna

Memórias da "mãe" capixaba de Ayrton Senna

Juracy Moreira dos Santos foi governanta da casa do piloto e conta como era o dia-a-dia com o Tricampeão que virou lenda do esporte brasileiro

Publicado em 3 de maio de 2014 às 21:32

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“A nossa relação se tornou de mãe e filho”. Essas foram as palavras da capixaba Juracy Moreira dos Santos, governanta da casa de Ayrton Senna, ao definir o dia a dia dela com o tricampeão mundial de Fórmula 1, nos tempos em que morava em Algarve, Portugal.

“Passei a cuidar dele, da casa. Ele também se preocupava muito com os empregados. Mandou até construir e decorar uma casa para mim, perto da piscina. Eu trouxe muita coisa de lá que está na minha casa hoje”, conta Juracy, hoje com 82 anos e morando em Niterói (RJ).

A chegada

Ayrton não desistiria facilmente da ideia de levar para a nova casa, no Algarve, no início de 1993, a fiel e carinhosa governanta dos tempos de Esher, na Inglaterra: “Quero que você cuide de tudo, Juracy”.  

Ela continuou irredutível e Ayrton propôs que ela experimentasse, “como se fossem férias”. Juracy aceitou, relutante. (...) Em março de 1993, ela desembarcou na casa onde viveria “dias maravilhosos” até maio de 1994. No fim de semana seguinte à sua chegada, já foi Juracy quem mostrou a Ayrton a nova decoração que ele pedira.

Senna queria que Juracy enchesse a casa de flores. Assim, ela comprou 34 grandes vasos da Espanha, enfeitou a entrada da casa com uma jardineira de beijinhos, mandou plantar duas palmeiras junto ao portão de entrada e uma terceira, perto da garagem.

“A nossa relação se tornou de mãe e filho. Passei a cuidar dele, da casa. Ele também se preocupava muito com os empregados. Sempre nos tratou com muito respeito”.

Perfeccionismo

“Ele não gostava de nenhum feixe de luz quando fosse dormir. Eu tive que mandar fazer tapão para pôr debaixo das portas para não deixar passar claridade. E não fazíamos barulho algum perto do quarto dele. Eu não deixava nem os outros empregados passarem pelos corredores quando estava dormindo”.

“Nunca gostei dela, e não gosto até hoje. Eu via que ela não era namorada para ele. Uma vez, chamei a atenção dela porque estava usando um short muito curto. Ela estava quase pelada, mas me disse que não iria trocar de roupa. Ayrton chegou perto da gente e perguntou o que estávamos falando. Eu disse o que havia acontecido e ele pediu ela para trocar o short”.

“Xuxa ligava sempre depois das corridas para saber como ele estava. E era sempre por volta de 4h30, 5 horas da manhã. Eu nunca acordei ele para atender. No fundo, ela achava que iria falar com ele. Eu falava, ‘se quiser é comigo. Ele não vai falar agora’. Eu tinha que colocar ordem, porque senão o povo não deixava ele nem comer. Eu era firme e não dava entrada, não”.

“Quando eu contava que a Xuxa tinha ligado, Ayrton falava: ‘Na hora que ela telefonar de novo, fala para ela vir aqui e não ficar só telefonando’. Eu respondia: ‘Mas e a branquela (referindo-se a Adriane)?’. Aí, depois, eu dizia que iria dar o recado à Xuxa. Mas ela nunca foi lá. Agora, ligava sempre. Para mim, parecia que ele gostava era da Xuxa”.

“Eu nem sempre assistia às corridas porque estava ocupada com algum serviço. Mas, no dia da morte, estava vendo. Nós íamos almoçar quando aconteceu. Ninguém comeu mais nada aquele dia. Quando vi a batida, tinha certeza de que Ayrton havia morrido. A dor foi como se eu tivesse perdido um filho. Eu gritava, não me conformava. Tinha que extravasar naquela hora”.

“Adriane estava lá. Ela se mostrou abalada. Tinha que sentir, mesmo que fosse de fingimento. Mas imagino que ela sofreu sim, não há brasileiro que não tenha sofrido naquele dia”.

“Parecia que Senna estava meio calado naquela semana. Eu até perguntei se havia acontecido algo. Ele disse que não, que estava tudo bem. Mas ele estava diferente, comendo menos, dormindo pouco”.

“Ele saiu de casa na quinta-feira. Na sexta, me telefonou para passar algumas ordens. Eu iria receber o irmão dele, com alguns amigos e a Galisteu. Perguntou o que eu iria preparar. Disse que seria peixe assado. Ele falou que era uma boa. No sábado à noite, ele telefonou novamente e disse que não era para fazer nada. Os convidados não iriam mais, somente a Adriane. E que não era para eu buscá-la no aeroporto. Era só para emprestar o carro. Ali eu achei estranho. E, para falar a verdade, acho que eles iriam terminar naquele fim de semana”.

“Fiquei em Algarve, para organizar tudo, até eles venderem a casa. Depois, mudei para Londres. Voltei ao Brasil há uns 10 anos. Sou aposentada, não me casei mais e não tenho filhos”.

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“Tenho contato, mas não sempre. Gosto muito deles. Conversava sempre com dona Neide pelo telefone. Ela sofre até hoje. Dor de mãe é para sempre, né? Eu também lembro dele a todo instante. Ele continua na mente e, às vezes, parece que não morreu. Mas sei que está no cantinho dele. Ele tinha um lugar preparado por Deus”.

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