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Perfis falsos de fora do país ameaçam combate às fake news

Perfis falsos de fora do país ameaçam combate às fake news

Para especialista, eleições de 2018 já estão contaminadas por notícias falsas e legislação brasileira não será efetiva para reprimir a desinformação

Publicado em 21 de maio de 2018 às 19:53

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A propagação de notícias falsas pela internet desafia as autoridades brasileiras. Apesar de já existirem mecanismos disponíveis para identificar perfis robôs e falsos – que espalham fake news nas redes sociais –, a Justiça ainda enfrenta dificuldades para conseguir tirá-los do ar e punir os responsáveis por essas contas. A avaliação é do pós-doutor em Comunicação Sergio Denicoli, em palestra realizada nesta segunda-feira (21), em Vila Velha.

O entrave, segundo o pesquisador, é que a legislação vigente no país não consegue alcançar os autores de perfis falsos hospedados no exterior. Denicoli pontuou ainda a falta de apoio efetivo de empresas como Twitter e Facebook no combate às fake news.

"As empresas não estão interessadas e a legislação brasileira não consegue alcançar estes perfis em sites estrangeiros. Se eu tenho um perfil falso na Inglaterra, por exemplo, influenciando as eleições do Brasil,  preciso entrar na Justiça dos países onde essas empresas estão sediadas. Pelo que eu acompanho, a regra geral é ignorar. Há, inclusive, determinações judiciais de juízes brasileiros que foram ignoradas pelo Facebook", afirmou Denicoli, no evento promovido Transparência Capixaba em parceria com a UVV.

O pesquisador afirmou que as eleições de 2018 já estão contaminadas por informações falsas. Para fazer essa análise, observou 288 mil usuários de redes sociais e identificou 28 mil robôs e perfis falsos na internet. E acrescentou que dificilmente a legislação brasileira avançará no combate a esse tipo de desinformação a tempo do pleito deste ano.  

Denicoli comparou as tímidas ações realizadas no Brasil com os mecanismos criados na Europa. Ele destacou a aprovação, em especial, de duas leis no Parlamento Europeu: a lei do esquecimento, que permite que usuários possam requisitar que todos os conteúdos que cite seu nome sejam retirados da web; e a lei de proteção de dados, que impede o uso de dados dos usuários de forma comercial.

"A Europa está sendo vanguardista, o Parlamento Europeu aprovou e os países estão aderindo. A tendência é isso chegar aqui no Brasil também. Nós tivemos um avanço importante quando aprovamos aqui no Brasil o Marco Civil da Internet, mas não avançamos, não houve uma regulamentação. O sistema político tem uma velocidade lenta para discutir a internet, que tem uma velocidade de mudança muito mais veloz. É provável que se passe essas eleições e as próximas sem termos leis mais efetivas de combate às fake news", analisou.

 

JORNALISMO PROFISSIONAL

Também na palestra, o jornalista e doutor em Comunicação Carlos Tourinho destacou que enquanto não houver uma legislação mais forte para combater as fake news, o jornalismo profissional será uma das armas fundamentais de defesa da democracia.

"A facilidade de se criar uma informação falsa e distribui-la pela internet é muito grande. Quem nunca recebeu uma mensagem que começasse com 'não sei se é verdade, só estou compartilhando'? A diferença dessas mensagens para aquelas produzidas por jornalistas é que poderemos ter a certeza de que haverá checagem, vai se ouvir os dois lados e a possibilidade de ser aquele conteúdo falso será muito menor", defendeu. 

VERIFICAÇÃO DE INFORMAÇÕES

Após as críticas do pesquisador, a reportagem do Gazeta Online entrou em contato com o Facebook e o Twitter, mas até a publicação desta matéria não houve retorno. No entanto, em uma publicação do blog institucional do Facebook, a empresa lançou no Brasil uma ferramenta de verificação de fatos em parceria com agências brasileiras de checagem.

"Nosso programa de verificação de fatos é resultado do feedback que recebemos da nossa comunidade. As pessoas nos dizem que não querem ver notícias falsas, muitas vezes construídas a partir de motivações econômicas ou políticas", diz o comunicado.

"Combate às fake news pelo Facebook é marketing"

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a Polícia Federal e algumas empresas como o Google e o Facebook têm adotado algumas estratégias para combate às fake news. Acha que é possível combatê-las e evitar que contaminem o resultado dessas eleições?

Essas iniciativas da PF e do TSE são iniciativas importantes para tentar vetar esse tipo de propagação, mas acho muito difícil que isso surta efeito. A legislação doméstica não alcança a esfera internacional, onde estão sediadas empresas como o Facebook e o Twitter, onde há maior divulgação de fake news. No quesito combate às fake news, para derrubar perfis robôs e falsos é preciso entrar judicialmente nos países onde essas empresas estão sediadas para tentar saber quem são os donos destes perfis. A regra delas, no geral, é ignorar essas determinações judiciais. Eu não acredito que elas estão tão interessadas em combater como aparentam estar. Acho que é mais uma questão de marketing.

As ferramentas que temos são suficientes para combater as fake news?

Não são e jamais vão ser. Este não é um assunto que só o Brasil precisa debater, é o mundo inteiro. Nós acessamos perfis robôs que estão em servidores do Canadá e da Rússia. A lei russa é muito complacente com informação falsa, por exemplo. Chegar a um consenso entre os países é muito difícil. Enquanto isso, as empresas não estão interessadas em serem reguladas, elas querem a auto-regulação, tomando as medidas pelo o que for interessante para elas. 

Em tempos de campanhas com candidatos com menos recursos financeiros, este "marketing" por fake news pode se tornar mais comum?

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Pelo contrário. O aparato tecnológico para esses sistemas de perfis falsos e robôs é de ponta e muito caro. São profissionais capacitados e com sistemas muito bem elaborados para que essas mensagens sejam difundidas e mascaradas para que pareçam orgânicas. Já fizemos o levantamento dos perfis de interferência no cenário político brasileiro e vimos que ele é imenso. Tendo em vista este aparato todo, dá para ver que tem muito dinheiro por trás disso. A pergunta que eu faço é de onde está saindo esse dinheiro? Acho que as autoridades têm que pensar sobre isso.

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