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Juiz de Kennedy é suspeito de favorecer ex-deputado em desapropriação

Juiz de Kennedy é suspeito de favorecer ex-deputado em desapropriação

O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) decidiu abrir Processo Administrativo Disciplinar e afastar o magistrado das funções

Publicado em 31 de maio de 2019 às 22:19

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Tribunal de Justiça decidiu abrir PAD e afastar magistrado. (Marcelo Prest)

Entre as suspeitas levantadas pela Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) para propor a abertura de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra o juiz da Comarca de Presidente Kennedy, Marcelo Jones de Souza Noto, está uma transação envolvendo o ex-deputado estadual Rhudson Carlos de Souza, o Rudinho. O TJES decidiu, na quinta-feira (30), instaurar o PAD e afastar o magistrado

O ex-deputado não responderá ao procedimento que, por ser administrativo, diz respeito apenas ao juiz. E é a conduta do magistrado no caso que será apurada.

Na desapropriação de uma área pertencente ao ex-deputado, Marcelo Noto teria autorizado o valor de cerca de R$ 700 mil a ser pago pela Prefeitura de Presidente Kennedy. O imóvel, no entanto, havia sido adquirido por R$ 100 mil e o município pretendia desembolsar R$ 166.244,38. Ainda de acordo com depoimentos feitos à Corregedoria, Rudinho e o juiz eram amigos. 

De acordo com investigações preliminares da Corregedoria, "em ação, ajuizada em 30/08/2015, o município havia declarado utilidade pública de um imóvel na zona rural com área total de 1.432m² cujo possuidor, 'Rudinho', não aceitou transferi-la amigavelmente". 

"Rudinho teria adquirido a posse da área em 23/04/2014, por meio de escritura pública de transferência da cessão de posse, pagando um valor de R$ 100.000,00", registrou ainda o órgão correicional. Para desapropriar a área, a prefeitura apresentou um laudo de avaliação no montante de R$ 166.244,38.

PERITO

"O magistrado Marcelo Noto, porém, deixou para analisar o pedido da imissão na posse depois de confeccionado laudo por perito avaliador nomeado pelo juízo. No laudo apresentado, o perito avaliou o direito de posse em R$ 695.730,00, quantia muito superior e quase sete vezes maior que o valor pago por 'Rudinho' para comprá-lo e também o valor indicado pelo município."

AMIZADE

O juiz e o ex-deputado seriam amigos íntimos. Isso, pelo menos, foi o que a Corregedoria depreendeu dos depoimentos que ouviu. De acordo com uma servidora da Comarca, Rudinho chegou a sediar, em sua casa de praia, na Praia dos Cações, em Marataízes, a festa do segundo casamento do magistrado. "Em outra ocasião, Rudinho também emprestou sua casa de Presidente Kennedy para a confraternização do juiz e servidores do fórum, conforme depoimento", consta nos autos.

"Os autos contêm episódios suspeitos, envolvendo pessoas que são amigas íntimas do magistrado Marcelo Noto, que receberam no processo quantias financeiras consideráveis, a partir de uma avaliação pericial igualmente suspeita, porque exorbitante o valor apontado em comparação ao valor da aquisição da posse do imóvel e ao valor da avaliação realizada pelo município", anotou a Corregedoria.

DEFESA

A defesa do magistrado alegou, ainda no âmbito da apuração preliminar, que a avaliação do valor a ser pago caberia ao perito judicial e que o magistrado não é amigo de Rudinho.

"Não se tentou afirmar que a avaliação caberia ao magistrado, e sim, a suspeita em torno da exorbitância do valor apurado pelo perito do juízo que foi chancelada pelo juiz Marcelo Noto, sem que fosse analisada sua valorização, no curto intervalo de um ano, de aproximadamente 800%", rebateu a Corregedoria.

Já durante a sessão do Pleno do TJES, na quinta-feira, o advogado Marco Antonio Gama Barreto, em sustentação oral, abordou o episódio e rebateu a informação sobre a festa de casamento do juiz ter sido realizada em propriedade de Rudinho. 

"Tem eventos que são absurdos. Por exemplo, diz que ele teria favorecido o ex-deputado Rudinho numa ação de usucapião que teria tramitado mais rápido. Essa ação levou um ano e meio para ser concluída, não tramitou rápido. E isso é rebatido por uma declaração do próprio Rudinho no processo", afirmou.

"Ela (a servidora que prestou depoimento) diz, inclusive, uma coisa que seria impossível, que o doutor Marcelo teria favorecido Rudinho no processo e Rudinho teria custeado o casamento do doutor Marcelo. Só que o doutor Marcelo casou-se em 2013, o segundo casamento dele. E a ação de Rudinho foi ajuizada em 2016. Só se ele voltasse no tempo para fazer isso."

"E o dono da pousada na qual o doutor Marcelo se casou, ele não se casou em Praia dos Cações, como é dito por essa servidora. O dono da pousada deu declaração, foi juntada aos autos ontem (quarta-feira, dia 29). Ele diz que quem custeou o evento foi o próprio doutor Marcelo e ele confirma que a festa de casamento foi realizada na pousada dele e não em qualquer local que envolva o ex-deputado Rudinho", complementou.

Devido à decisão do TJES de abrir o PAD, a defesa do juiz emitiu a seguinte nota: "Os advogados Marco Antônio Gama Barreto e Henrique Zumak, responsáveis pela defesa dos Magistrados Marcelo Noto e Vanderlei Marques, afirmam que os juízes negam peremptoriamente as acusações, seja no tocante à má conduta profissional, quanto pessoal.

A abertura de processo administrativo disciplinar lhes proporcionará a oportunidade de confirmar e aprofundar a investigação defensiva já realizada, quando provarão suas respectivas inocências. Quanto ao teor das acusações, não há possibilidade de manifestação diante do segredo de justiça imposto aos processos".

A abertura do PAD não significa que o magistrado realmente cometeu irregularidades, apenas que o TJES considera que os fatos merecem mais apuração. O afastamento não o impede de receber salário. Ao final do processo, se o juiz for punido, a pena pode variar de advertência a aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais. 

RUDINHO

Apesar de Rudinho não ser alvo do processo administrativo, como o nome dele foi citado na apuração preliminar da Corregedoria e na sessão do TJES, a reportagem do Gazeta Online entrou em contato com o ex-deputado nesta sexta-feira (31). Rudinho contou que tinha um galpão em Presidente Kennedy e não estava disposto a vendê-lo à prefeitura pelo valor oferecido pelo município.

"A prefeitura desapropriou sem eu ter interesse, botou um valor inferior ao que eu achava correto e aí eu pedi para reavaliar. Eu não queria vender e entrei na Justiça. Normal, ué. Eu entrei com processo judicial, requerendo meus direitos. Ele (Marcelo Noto) julgou da forma que deveria ter julgado, procedimento normal", ressaltou.

Questionado sobre a possível amizade com o juiz, o ex-deputado disse que nem estava falando com o magistrado naquela época, "devido a outras coisas". E que o conhece, "de dizer oi", mas já há tempos não mantém contato com ele. Rudinho também destacou que não está mais na vida pública e pediu que a reportagem o deixasse em paz.

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