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Apesar de crise política, ES tem recorde de filiações partidárias

Apesar de crise política, ES tem recorde de filiações partidárias

Dados do TSE mostram que em 14 anos nunca tantos capixabas estiveram filiados a partidos políticos

Publicado em 17 de janeiro de 2018 às 19:23

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Apesar do desgaste generalizado dos partidos políticos e da crise de representação que as legendas têm enfrentado nos últimos anos, os capixabas continuam ligados a agremiações partidárias. Embora o senso comum sugira distanciamento entre pessoas e partidos, números oficiais mostram que, em 14 anos, nunca tanta gente esteve filiada a partidos políticos no Espírito Santo.

De acordo com dados disponibilizados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), eram 342.152 pessoas filiadas a algum dos 35 partidos em dezembro de 2017. O número corresponde a 12,55% de todos os 2.725.349 eleitores cadastrados até o período. (veja gráficos no final do texto)

Em 2004, a proporção era de 12,08%. No intervalo analisado, o ano de 2006 registrou o menor percentual de eleitores filiados, 9,61%. Apesar de apresentados pelo TSE, os números são atualizados pelos próprios partidos, nos meses de abril e outubro. No Estado, o PMDB é o que tem mais filiados. É seguido, na ordem, por PDT, PP e PT.

Cientistas políticos consultados pelo Gazeta Online elencam algumas hipóteses para o crescimento da adesão das pessoas às legendas. Entre elas, a do desenvolvimento da consciência política, a do reposicionamento de segmentos da classe média e até a da ampliação da inserção de grupos religiosos na política partidária.

Pelo modo de ver dos dirigentes partidários, a leitura não podia ser outra. Dizem que as agremiações são importantes e acolhem anseios de uma parte da população. O presidente do PT estadual, João Coser, por exemplo, afirma que insatisfações com o governo de Michel Temer (PMDB) têm atraído novos petistas.

"Estamos com uma campanha de filiação em andamento com bons resultados. Muita gente está procurando se filiar ao PT principalmente em função do desmonte das políticas públicas do governo Temer. Muita gente revoltada com as reformas está buscando filiação ao PT", afirmou o dirigente. O PT é o quarto em quantidade de filiados no Estado, com mais de 25 mil membros.

O PDT é o segundo, atrás apenas do PMDB. São mais de 32 mil pedetistas. O presidente do partido, Sérgio Vidigal, diz que denúncias de corrupção e desgastes que pesaram contra líderes da sigla não podem ser comparados aos que enfrentam figuras de PSDB, PMDB e PT.

"Eu diria que quem tem a maior identidade ideológica é o PT, que foi um partido que construiu muitas bases. Tanto é que o estrago nele seria muito maior se ele não tivesse essa base. O PDT tem mesmo perfil. Construímos o partido em cima de uma base, de bandeiras", frisou Vidigal.

Os principais dirigentes do PMDB estadual não deram retorno à reportagem. O partido tem mais de 42 mil filiados no Estado. 

Lucas Salles é líder comunitário da Ilha do Príncipe, em Vitória, tem 24 anos e é filiado ao PMDB desde 2012. Afirma que escolheu o partido por ideologia. Antes de assinar a ficha de filiação, participou de uma convenção nacional da juventude do partido, no Rio, e gostou do que viu. 

"O debate me interessou muito. Era sobre política pública para a juventude, sobre acesso dos jovens ao espaço de poder. Na época, eu recebi convites do DEM e do PT. E o que mais me interessou foi o PMDB", disse ele, que hoje é o coordenador estadual do segmento jovem do partido.

Mas como um jovem eleitor vê o fato de estar filiado a um partido que tem figuras como Eduardo Cunha, Geddel Vieira Lima e Moreira Franco? "Cabe à Justiça cuidar. Temos uma legislação que dá o direito de se defender. A Justiça tem encaminhado isso e a população está tendo uma revolta e uma indignação porque a Justiça está cuidando. Está tudo sendo apurado", afirmou Lucas, que teve 577 votos para vereador da Capital na eleição de 2016.

Aos 26 anos, Weverson Meireles contou que se filiou ao PDT no mesmo dia em que completou 16 anos e tirou o título de eleitor. "Sou filiado há dez anos. Eu era militante do movimento estudantil e tinha uma admiração muito grande pelo PT e pelo PDT. Sabia que queria me filiar a um partido de esquerda. Meu pai era filiado e por influência dele conheci mais a influência do Leonel Brizola", explicou.

Weverson nunca disputou uma eleição e ainda não pensa em concorrer, mas há três anos é o secretário-geral do partido. 

OUTRA LEITURA

O crescimento do total de filiados não significa automaticamente que a população capixaba está ficando mais politizada e crítica. Nem é uma prova cabal de que os eleitores que assinaram ficha de filiação acreditam piamente que as soluções que o país precisa dependem dos partidos que aí estão. Essas são as ressalvas feitas por cientistas políticos.

Um deles, Fernando Pignaton, é taxativo ao dizer que não existe cidadania partidária, ou seja, falta aos filiados poder de decisão e mesmo de participação na vida das legendas.

"Há sempre tendência de fechamento em torno de uma cúpula. Se tem muito ou pouco filiado, isso pouco importa. Se a gente tivesse uma conjuntura em que todos os filiados, por exemplo, participassem de eleições, poderíamos inferir a importância de um partido com 20 mil filiados. Mas não é assim. Hoje, uma meia dúzia escolhe", salientou o especialista.

Para ele, a democracia interna dos partidos deveria ser aprimorada. Hoje, dirigentes são eternizados no comando das legendas e até mesmo a definição sobre quais serão os candidatos das siglas nas eleições sai das cúpulas.

Já o professor da PUC-MG Róbson Sávio Reis chama a atenção para o perfil dos novos filiados a partidos. Ele observa que, em geral, são pessoas de classe média, já ligadas a algum tipo de política institucional, como a sindicatos de trabalhadores ou patronais, e de grupos evangélicos.

"Temos uma legislação partidária e eleitoral que favorece demasiadamente as elites políticas e econômicas. Os partidos acabam, de maneira geral, respondendo a interesses de grupos mais do que a interesses coletivos", comentou.

Reis também avalia que a militância partidária não é algo que interessa a maioria do povo brasileiro. Trata-se de "um privilégio" impossível àqueles que dedicam a maior parte do tempo a "garantir a própria subsistência".

Não quer dizer, entretanto, que a população de renda mais baixa seja despolitizada.

"Pesquisas mostram que a maioria dos cidadãos não entende a democracia representativa como instrumento de manifestação dos desejos. Não significa que as pessoas não discutam e não estejam inteiradas sobre questões políticas. Em qualquer reunião familiar, social, discute-se o sistema de representação, falam dos governantes, da roubalheira. Estão discutindo política", destacou.

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