> >
Comissão Justiça e Paz: pedido ao Papa para reverter extinção

Comissão Justiça e Paz: pedido ao Papa para reverter extinção

Manifesto de movimentos sociais ligados aos Direitos Humanos também será enviado à CNBB

Publicado em 17 de agosto de 2018 às 23:06

Ícone - Tempo de Leitura 0min de leitura
Manifesto de movimentos sociais no Espírito Santo será enviado ao Papa Francisco e à CNBB. (Andreas Solaro | AFP)

Os movimentos sociais ligados aos Direitos Humanos vão pedir ao Papa Francisco e à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) que reverta a extinção da Comissão Justiça e Paz (CJP). A eles será encaminhado, na próxima semana, o manifesto assinado na noite desta sexta-feira (17), durante um ato de solidariedade à comissão.

No documento é destacado que extinguir a CJP é sufocar a luta pelos Direitos Humanos. "Por isso, pedimos a interferência da CNBB e do nosso querido Papa Francisco para que o ato arbitrário do atual arcebispo (dom Luiz Mancilha) seja revisto, e que tenhamos novamente nossa respeitada CJP viva e atuante de forma ética em defesa da vida, como sempre foi em toda a sua história", é dito no manifesto.

São feitas ainda críticas à atitude do arcebispo de Vitória, Dom Luiz Mancilha, que no dia 2 deste mês extinguiu a CJP. A decisão ocorreu um dia após o presidente da comissão, Bruno Toledo, entregar sua carta de demissão ao arcebispo. Bruno ficou contrariado ao saber que o prelado recebeu o senador Magno Malta (PR), que disse que foi levar ao líder católico o seu apoio na luta contra o aborto.

Dom Luiz Mancilha e o senador Magno Malta na Cúria Metropolitana, durante encontro que motivou crise na Igreja Católica. (Reprodução | Facebook)

A atitude de Mancilha é vista como uma retaliação. "Sem qualquer autocrítica ou conversa com os demais componentes da CJP, e num gesto de autoritarismo extremo, o arcebispo, no dia seguinte à renúncia do presidente, extinguiu a Comissão Justiça e Paz. E ainda afirmou que seguia as novas diretrizes do Papa Francisco. São 40 anos de uma história de luta e resistência profética interrompidos pela caneta de um líder religioso fora do seu tempo e em descompasso com o clamor do seu povo", diz o texto.

O argumento do arcebispo para fechar a comissão foi o de que, no final de 2016, o Papa Francisco, através de Carta Apostólica, instituiu o Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral, dando-lhes funções e competências distribuída em outras áreas da igreja, como algumas pastorais e a própria CJP. "Era meu desejo, já há algum tempo, propor a mesma organização na Arquidiocese de Vitória, mas queria fazê-lo de maneira suave respeitando a história desta Igreja Particular", diz o arcebispo em sua carta.

Para os líderes dos movimentos sociais, o comando da Arquidiocese de Vitória, não entendeu o apelo feito pelo Papa Francisco. "Na contramão da história, de costas para as necessidades do povo capixaba, em total dissintonia com as diretrizes emanadas pelo Vaticano, o arcebispo abraça e se deixa usar eleitoralmente por um dos representantes da mais retrógrada e fisiológica política brasileira. Alguém que defende abertamente a pena de morte, a redução da idade penal, a castração química, e que apoia um candidato a presidente que nega ter havido ditadura militar no Brasil, relativiza a tortura, faz declarações misóginas, homofóbicas e racistas", destaca o documento.

É dito ainda no manifesto que extinguir a CJP é fechar a porta da Igreja aos movimentos sociais. "É afirmar ao povo capixaba que o arcebispo fecha os olhos da igreja ao drama político-social que vive nosso povo. Extinguir a CJP é um recado claro da posição que o arcebispo deseja que a Igreja tome em relação ao violento e acelerado processo de retirada de direitos do povo e à ameaça real que sofre a democracia brasileira".

De acordo com Bruno Toledo, ex-presidente da Comissão, a manifestação dos movimentos sociais é um ato de desagravo e um reconhecimento da importância da comissão nos últimos 40 anos e de que a história dela não pode terminar assim. "Queremos que o Vaticano tome conhecimento do que está acontecendo. E que fique um apelo para o próximo arcebispo, para que ele possa refazer esta história", assinalou.

O manifesto que será encaminhado ao papa destaca a situação de violência, desigualdade e de desrespeito aos direitos humanos no Brasil e no Estado. "Aqui jovens e mulheres, pobres e negros, são alvo cotidiano de ações de violação dos direitos humanos. As prisões capixabas foram alvo de denúncia internacional por vilipendiar a vida dos serem humanos que ali estão encarcerados, e a violência não cessou. Crimes ambientais têm retirado o pão de cada dia de muitos capixabas pobres, a austeridade governamental local tem redundado em um austericídio sem precedentes, negando o acesso a direitos básicos de saúde, educação, moradia, dentre outros. Este cenário vem exigindo de cada um de nós uma atenção ao que se passa com a parcela mais pobre e vulnerável da população".

Participou do ato de solidariedade, realizado na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes),  o jurista João Baptista Herkenhoff, que foi o primeiro presidente da comissão Justiça e Paz.

CRIAÇÃO

A CJP foi criada em setembro de 1977, pelo arcebispo dom João Batista e o bispo auxiliar dom Luiz Gonzaga Fernandes. Desde então ela tem feito parte da história do Espírito Santo. Nos último 40 anos esteve presente no enfrentamento da ditadura, da redemocratização, atuou nas lutas contra o crime organizado, participou do Fórum Reage-ES. Foi atuante nos momento de graves crises no sistema prisional, que era alvo de constantes rebeliões, onde ela atuou em busca de melhorias, e posteriormente nas denúncias das violações de direitos nas chamadas "Masmorras capixabas".

Este vídeo pode te interessar

Sua luta mais recente foi em prol das vítimas da tragédia do Rio Doce, decorrente do rompimento de uma barragem. "Em todos os momentos das últimas quatro décadas ela estava presente onde foi preciso lutar pelos direitos humano. Era a voz pobre, da mulher vilipendiada, do preso torturado, de toda a população atingida pelo crime organizado, pela Le Coq", relatou Bruno Toledo, seu último presidente.

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais