> >
'O exemplo do Chile': postagem tem dados falsos sobre Previdência

"O exemplo do Chile": postagem tem dados falsos sobre Previdência

Publicação que circula em redes sociais sobre a economia e Previdência chilena mistura informações verdadeiras e falsas

Publicado em 17 de julho de 2019 às 01:11

Ícone - Tempo de Leitura 0min de leitura

"O exemplo do Chile", um texto que circula em redes sociais sobre a economia e Previdência chilena, mistura informações verdadeiras e falsas para concluir de forma enganosa que os bons índices naquele país têm relação com uma “quase extinção dos socialistas” e que contaram com a ajuda do atual ministro da Economia do Brasil, Paulo Guedes.

A partir de dados de páginas e índices oficiais do governo do Chile e de organizações internacionais como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), é possível afirmar que a maior parte das informações no texto pode ser considerada falsa ou enganosa.

As informações foram checadas pelo projeto Comprova, coalização que reúne 24 veículos de imprensa do Brasil para combater as desinformações relacionadas a políticas públicas do governo federal. Participaram das etapas de checagem e de avaliação da verificação jornalistas de AFP, BandnewsFM, TV Band, Revista Piauí, Poder360, Correio do Povo, Metro, UOL, Estadão, Gazeta Online e SBT.

Comprova. (Comprova)

O texto afirma que “os socialistas quase foram extintos” no Chile, mas o Partido Socialista chileno continua sendo relevante na política local. O PS elegeu 19 deputados nas eleições de 2018 e é, atualmente, o terceiro partido com mais representação na Câmara de Deputados. A sigla governou o Chile entre 2000 e 2010, com Ricardo Lagos e Michelle Bachelet, e, entre 2014 e 2018, novamente com Bachelet.

É verdade que o salário mínimo do Chile é de 301 mil pesos (R$ 1.662 em conversão no dia 16 de julho). Isso pode ser conferido no site da Dirección del Trabajo, um órgão ligado ao Ministério do Trabalho e da Previdência Social do Chile que fiscaliza questões trabalhistas.

O texto usa informações falsas sobre a Previdência no Chile. Afirma, por exemplo, que o sistema de capitalização é “aprovado por maioria da população”. A realidade é justamente a oposta. Uma pesquisa feita pelo instituto Cadem, em junho, mostrou que 88% da população concorda com a necessidade de uma reforma no sistema de capitalização gerido por fundos de pensão.

Texto compartilhado sobre economia chilena nas redes sociais. (Reprodução)

Em outra pesquisa local, publicada em maio pelo Centro de Estudos Públicos, o sistema de aposentadorias foi o segundo problema mais mencionado pelos entrevistados quando perguntados sobre quais os três problemas cuja resolução merecia maior esforço do governo.

Também não é verdade que a aposentadoria tem como valor mínimo o salário mínimo. Segundo um estudo da Fundação Sol, organização dedicada a questões trabalhistas, em março de 2019, metade dos 708 mil aposentados que receberam uma aposentadoria por idade obtiveram menos de 151 mil pesos — equivalente a R$ 834. Das pessoas que contribuíram entre 30 e 35 anos, 50% receberam uma aposentadoria inferior a 293.300 pesos — equivalente a R$ 1.620. Esses valores são inferiores ao salário mínimo do Chile.

Os beneficiários do sistema de Administradoras de Fundos de Pensões (AFP) que completarem 60 anos (mulheres) e 65 anos (homens) têm direito a pedir aposentadoria por idade. A poupança previdenciária é feita por meio de contribuições ou depósitos em uma conta das AFP de um montante equivalente a 10% da remuneração ou renda tributável do trabalhador.

É falso, também, que pessoas físicas não pagam imposto de renda no Chile. De acordo com informações do Serviço de Impostos Internos (SII) do Chile e da Secretaria-Geral de Governo, toda pessoa física com rendimento anual igual ou superior a 7.833.186 pesos (R$ 43.275) precisa fazer a declaração. Também é o caso de quem recebeu pagamentos de mais de um empregador, de mais de uma pensão ou de um empregador e uma pensão, entre outros casos.

Também não é verdade que o Chile tenha um “imposto único”. De fato há um Imposto sobre Vendas e Serviços no Chile, o IVA, com alíquota de 19%, mas o site do Serviço de Impostos Internos mostra que há vários impostos diretos e indiretos no país.

É falso, também, dizer que o Chile tem apenas quatro empresas estatais. Há dezenas delas, como mostra o site do Ministério da Fazenda chileno. Apenas no setor de transportes portuários, constam dez empresas 100% estatais.

A POSTAGEM

O registro mais antigo de publicação deste texto enganoso encontrado pelo Comprova data de 7 de abril de 2019. Ele foi publicado pelo perfil Sabadini Motociclista no Facebook com um título diferente: “Visão econômica do Chile”. Essa publicação foi feita quatro dias depois de Paulo Guedes e deputados federais da oposição baterem boca durante audiência sobre a reforma da Previdência na Câmara.

Na ocasião, oposicionistas criticaram o modelo chileno de Previdência. Guedes já afirmou que o regime de capitalização, usado no Chile, fez o país virar a “Suíça da América Latina”, e o próprio presidente Jair Bolsonaro admitiu se inspirar no modelo chileno.

Desde o início de abril, o texto vem sendo compartilhado em outras páginas e perfis de Facebook, em perfis de Instagram e em grupos de WhatsApp. O conteúdo também foi replicado em uma sequência de mensagens (thread) pela conta do Twitter @tinasouzario: a primeira delas alcançou, entre 8 e 15 de julho, 185 retweets e 489 curtidas.

A publicação na página Ranking dos Políticos no Facebook, feita em 13 de julho de 2019, gerou até o dia 16 de julho 2,6 mil compartilhamentos. O Comprova também encontrou a publicação em um blog chamado Blog do Robson Sampaio.

ATUALIZAÇÃO

Este vídeo pode te interessar

Depois da publicação desta verificação, a página Ranking dos Políticos entrou em contato com o Gazeta Online e incluiu uma errata em seu post de 13 de julho.

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais