Arquiteto professor da Ufes e diretor do IAB/ES. Cidades inovacao e mobilidade urbana tem destaque neste espaco.

Se lei no Brasil é complexa até para o Supremo, imagine para o cidadão

Basta ver os embates na mais alta corte do país, na qual os ministros dividem-se em quase todos os temas. Ou seja, para alguns deles, a lei diz uma coisa, para outros, a lei diz o contrário

Publicado em 03/10/2019 às 05h00
Atualizado em 03/10/2019 às 05h00
Placa de estacionamento proibido no meio do mato. Crédito: Pixabay
Placa de estacionamento proibido no meio do mato. Crédito: Pixabay

A legislação brasileira, tão debatida atualmente, até mesmo pela necessidade de atualizar-se ao mundo do século XXI, baseia-se num curioso paradoxo: de um lado, qualquer pessoa que cometa algum delito não pode argumentar como defesa o desconhecimento da lei; e, de outro lado, tudo que não é proibido, é permitido!

Um caso bem exemplar é em relação à sinalização de trânsito. Para que num trecho de uma rua qualquer seja proibido estacionar, é preciso haver uma placa dando tal informação ao motorista, pois, do contrário, ali se pode estacionar. No entanto, todo motorista deve saber que não deve estacionar na frente de hidrantes ou nas entradas de garagem, bem como sobre as faixas de travessia de pedestres. Mas, basta que algum delinquente arranque uma placa de proibido estacionar, que a situação muda e o lugar torna-se, supostamente, permitido para o estacionamento de veículos, de tal modo que a guarda de trânsito nem sequer pode multar e/ou rebocar o veículo.

Mas como um cidadão comum pode saber o que pode ou o que não pode, o que é permitido e o que é proibido, se, aparentemente, nem a Justiça sabe? Afinal, basta ver os embates na mais alta corte do país, o Supremo Tribunal Federal, onde os ministros dividem-se em quase todos os temas. Ou seja, para alguns deles, a lei diz uma coisa, para outros, a lei diz o contrário.

Contudo, entre a criatividade, a malandragem e até mesmo a má fé recorrente no país, o legislador sempre busca encontrar novos regramentos que coíbam tudo que possa ser entendido como ilegalidade, infração, etc.

E assim vamos nos tornando um país com excesso de leis, decretos, portarias, normas e, consequentemente, com mais uma situação paradoxal, que é a tal expressão bastante conhecida: “No Brasil tem leis que pegam e leis que não pegam”.

Só que, para o cidadão comum, que não necessariamente é criativo, nem malandro, que pratica a boa fé, um sujeito honesto portanto, lidar com tanta legislação, ser obrigado, hipoteticamente, a conhecer toda a lei para evitar cometer algum delito por desconhecimento, enfim, para tal pessoa, viver no Brasil “é osso”...

Mas, acreditem ou não, para alguns brasileiros a situação pode ser ainda pior, como é o caso dos arquitetos e engenheiros.

Vejamos então!

Execução de obras exige projetos demorados. Crédito: Pixabay
Execução de obras exige projetos demorados. Crédito: Pixabay

Um projeto de arquitetura ou de engenharia completos podem levar meses ou até anos para serem desenvolvidos até o nível executivo, que é a parte destinada a instruir a realização de uma obra, seja um edifício ou uma ponte. O projeto deve, obviamente, obedecer a toda legislação vigente que incide sobre as construções, de acordo com sua tipologia, e que vai do Plano Diretor, ao Código de Obras, passando pelas diversas de Normas Técnicas que podem ser uma quantidade enorme regulando simultaneamente uma única obra.

Contudo, o início de uma obra pode se dar muito tempo depois de finalizado os projetos executivos, pois ainda é necessário que se faça o orçamento detalhado e a escolha da empresa responsável pela realização da obra, tal como ocorre em grandes construções privadas e em todas as obras públicas por meio de uma licitação.

Daí que da finalização dos projetos executivos, até a conclusão de uma obra, pode se dá muito tempo, às vezes até alguns anos. E só então se pode solicitar o habite-se, a aprovação da construção pela prefeitura e, quando for o caso, também pelo Corpo de Bombeiros. A pegadinha, porém, é que se algum regramento mudar ao longo deste longo processo, a obra pode não ser aprovada. É como se os arquitetos e engenheiros tivessem também que praticar a futurologia, para saber quais serão as normas no momento de aprovação das obras daqui a alguns anos.

E, como se sabe, aqui se adora legislar, sempre com a justificativa de aperfeiçoar a sociedade, que, de fato, precisa de regras. Mas bastaria um pouco de bom senso e responsabilidade que poderíamos ser um país menos regrado, mais simples para se viver.

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