Crítico de cinema e colunista de cultura de A Gazeta

Severino quer inspirar "voltas por cima" em EP de estreia

Duo capixaba lança o EP "Próxima Estação" com canções solares e cheias de energias positivas

Publicado em 18/11/2019 às 19h37
Atualizado em 18/11/2019 às 19h37
Severino. Crédito: Gabriel Hand
Severino. Crédito: Gabriel Hand

Acredite: ter banda é complicado. São brigas de egos, momentos e interesses distintos de músicos, dinheiro... A lista de complicadores é enorme. Cansado de tentar manter sua ex-banda, o Bárbara Dauras, o baixista e compositor Humberto Campos decidiu se reinventar. "Ou me reinventava ou deixava de desistir, mas não tava a fim de deixar de existir musicalmente", brinca o músico que, ao lado de Edson Freitas, forma o duo Severino.

Lembra da figura eternizada por Paulo Silvino no "Zorra Total", o "quebra-galhos" Severino? No caso da banda, o Severino é uma bateria eletrônica que acompanha os dois músicos o tempo todo.

Na estrada desde 2017, o duo lança agora seu primeiro EP. "Próxima Estação" é um trabalho solar, animado e positivo que mistura música brasileira a indie rock numa pegada bem contemporânea. Com produção de Jackson Pinheiro (ex-Supercombo, André Prando, Silva), o disco tem momentos que lembram Lupicínio Rodrigues ("Amor Próprio"), mas também carrega influência forte da música pop contemporânea. Confira abaixo a entrevista na qual Humberto fala sobre os problemas da produção do disco e até de um colaborador que "só faltou ser abduzido". 

Da onde surgiu o Severino?

O Severino surgiu justamente da dificuldade que eu tinha de segurar uma banda. Tinha uma banda chamada Barbara Dauras e era aquela complicação: entra músico, sai músico, entra batera, sai batera... Eu só tinha sorte com guitarrista, mas baterista e vocalista era complicado. Estávamos no meio do processo de produção de um EP quando o baterista saiu; quando arrumamos outro, o vocalista saiu. Aí cheguei à conclusão de que eu, que sou compositor, ou me reinventava ou deixava de existir. Como não tava a fim de deixar de existir musicalmente, tive que me reinventar. Fui ver como eu faria isso e descobri o The Kills (duo americano que usa bateria pré-programada) e falei "é isso". Precisava arrumar alguém pra cantar e tocar guitarra. O resto a bateria eletrônica faria.

Como vocês e o Edson se juntaram?

Foi via Facebook. Eu vi o perfil dele e mandei algumas coisas. "Escuta isso aqui e vê o que você acha". Aí ele curtiu, gostou e começamos a tocar. Antes do Edson foram quase dois anos tentando arrumar uma banda. A história é complicada, músico em Vitória é complicado. Tem gente que se empolga, mas na hora de começar a trabalhar e botar a mão na massa é "porra, cara... tenho uma faculdade, um trabalho, não sei o quê...". Aqui o pessoal não dá jeito, a não ser quem está no rolê e com a faca nos dentes. É justamente essa galera que se segura, o André Prando, a Gabriela (Brown), essa galera surgindo que está bem. Essa galera que curte música, tem o sonho de ser músico, mas está na faculdade de Direito pensando na prova do concurso, não rola. O Severino surgiu justamente por conta dessa dificuldade, eu não conseguia banda, tava difícil, aí me reinventei. Eu não tenho o talento de cantar, então não podia colocar o violão embaixo do braço e ganhar o mundo, precisava exercer a humildade de ser dependente de alguém.

As músicas já existiam? Do EP?

Tenho mais de 100 músicas compostas. Comecei a compor coisas novas, não ficou nada do Bárbara Dauras. Comecei a compor as músicas no baixo mesmo, "Próxima Estação", por exemplo. Meu grande desafio foi fazer a base, porque eu não sabia como. Isso foi o maior arranca rabo pra mim. Fui num processo louco de pesquisar, futucar, errar, até  conseguir um modus operandi meu. Aí tudo desembolou e o negócio começou a fluir.

Estão juntos há quanto tempo?

Começamos em julho de 2017. Começamos a produzir as músicas em janeiro e ficamos seis meses formando repertório autoral nesse processo de conhecer a pessoa, se entender, no processo de se descobrir, descobrir o outro.  Nosso desafio era tocar em Vitória pelo menos uma vez por mês para podermos nos entender no palco. Porque pra mim, baixista, acostumado a tocar com baterista, tocar com uma base eletrônica, com o Severino, é complicado. Porque o Severino não erra, não atropela, ele fica no beat, e se você errar, ferrou tudo. Não tem margem pra erro ou improviso. As coisas foram sempre muito pensadas, indo pra BH, SP, festivais para falar do material, mesmo sem ter nada gravado. Estava tudo planejado: iríamos gravar um single no começo de 2018, com o Felipe Gama, e quando chamei uma assessora ela sugeriu fazer um clipe. Eu não tinha me planejado financeiramente, não estava com isso na cabeça, mas fui correr atrás. Contratei um cara e começou a ficar tudo estranho. 

Estranho como?

Tava tudo planejado, lançar o single, medir o retorno, ver onde errou, acertou, depois fazer um EP baseado na experiência, lançar e nesse processo começo a pleitear shows fora, mini-turnês, mas o cara do clipe começou a enrolar. Aconteceu de tudo com ele, só não foi abduzido. Ficou no "mês que vem eu te entrego" por um ano. Fiquei travado. Não conseguimos tocar toda semana em Vitória com autoral, mas também não valia a pena ir pra fora sem material, sem nada lançado. Aí fizemos um repertório paralelo de releituras, desde Rubel, Martinho da Vila chegando a Araketu. No meio tem Caetano, O Rappa, uma suruba, pra ir abrindo caminho, mostrando a cara. O repertório todo com nossa cara, nossa vibe, com o Severino. Isso acabou me tirando o foco no projeto autoral. O ano passado (2018) foi muito. Fizemos muitos shows, fomos para  Belo Horizonte, Contagem e Ouro Preto. Fomos para São Paulo na noite capixaba do SIM SP com gabriela Brown, Gavi, Cainã.... fomos representar uma nova safra da música capixaba. Este ano tinha o Formemus, tinha que ter música lançada pra participar, eu sem grana fui dar um jeito. Aí entrei em contato com Jackson Pinheiro e ele se animou. 

Como foi trabalhar com o Jackson?

Foi excelente. Ele não era acostumado a trabalhar no processo de base pré-gravada. Apanhou um pouco na primeira música, mas da segunda em diante foi muito legal. Houve muita troca, aprendizado. Ele pegou o que eu tinha feito, aproveitou muita coisa e lapidou a pedra bruta que já existia ali. Fomos construindo junto. Ele pegava uma ideia mínima, legal, mais simples, e fazia ela crescer, transformava em algo grandioso. Já começamos a produzir um segundo EP. Se tudo correr bem, lançamos um single em janeiro, com ou sem o videoclipe, e em março ou abril lançamos o segundo EP. Vamos estar com muita coisa na praça pra recuperar o tempo perdido. 

O disco é super pra cima, super animado...

Vínhamos num processo meio complicado, viemos de um ano difícil. Existe uma dificuldade grande de lidar com música aqui em Vitória, somos muito desvarlorizados pelas casas. Você manda o material e eles não te respondem. A nossa sorte é que quando tocamos as casas sempre ficam impressionadas e nos chamam pra voltar, mas é um processo desgastante. Faz parte do jogo, mas desanima um pouco. Também passamos por uns problemas pessoais, grana... A gente tava tocando por aí, mas eu dei uma cansada de ficar correndo atrás de shows também e fui me envolver mais com a produção do disco. Tem uma frase que eu digo que banda, independente de ser uma dupla, um duo, é um casamento poligâmico que tem tudo para dar errado. Eventualmente dá certo. Com a chegada do EP as coisas se revigoraram de um jeito que deu uma animada. São cinco músicas que falam sobre "dar a volta por cima". Tinha outras músicas fodas no nosso repertório, mas eu optei por essas mais pra cima. Eu perdi dois amigos pra depressão, a gente está vivendo um momento político difícil. Eu nunca vi tanta gente jovem com depressão, cara. Eu queria fazer um trampo a ver com tudo, com política, saúde mental, feminicídio... A gente vê que as pessoas estão precisando de uma coisa meio "preciso respirar, seguir em frente e mudar o rumo da minha vida".

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